Relatório alienígena

A humanidade corre, tem pressa; mas, não sabe bem, de quê. A avidez de futilidades cega, e quem tem olhos bons para o vil, geralmente não os tem para o nobre.

O mundo virtual nos invade sem virtude nenhuma; quem precisa saber da primeira vez da Anitta, do litígio de Zezé e Zilú pela guarda dos cães? Da favorita ao “miss bumbum”? Deve ser uma honra ser jurado num concurso assim. Não esqueçamos que o referido cujo, tem seu centro, que deve figurar o cérebro dos jurados.

As miscelâneas natalinas estupram a paisagem, antes, sadia; porcarias que, depois servirão de alegorias no carnaval; deve ser uma glória para Deus ser “honrado” assim.

A essa altura quem me lê pode estar pensando que sou um brucutu sem alma, incapaz de apreciar o belo. Pode ser, vai saber o louco que sou! Mas, como louco, sem noção fantasio que sou poeta, amante da beleza.

Em minhas fantasias de doido, desprezo simulacros, falsidade; amo ao belo real. E a beleza não tem pressa nem agenda. Quiçá, cúmplices, tipo, a sensibilidade leve qual pluma, abstraídos os pesos mortos da indiferença...

Aliás, sou privilegiado com alguns vizinhos amantes da “beleza” também. Ouvem “música” Walkin dead, os MCs da moda a todo volume estuprando meus frágeis tímpanos, desacostumados a tanta violência... Uma tsunami arrasou a praia da arte e nos resta caminharmos entre destroços rebuscando algum traste de valor que ficou, mas, é muita lama...às vezes encontro algumas peças de valor em antiquários.

Eu mesmo sou forçado a correr mais que gostaria; os trabalhos que faço têm prazo de entrega, pois, a humanidade tem pressa; o pergolado até sexta-feira; haverá uma formatura; o quiosque, até o Natal, óbvias razões... a pressa alheia me contagia.

Mesmo assim, num dia como hoje me desintoxico um pouco, andando no passo do gado. Amanhã, muitos farão seu trabalho a contragosto, sonhando com a sexta-feira, sua pressa de perturbarem aos vizinhos e ficarem bêbados...

A floresta da vida tem lá algumas clareiras para a devida contemplação... mas, as almas coisificadas se perdem no cipoal das ilusões, o barro que as amolda endureceu, não flexibiliza mais, e se a gente forçar quebra.

Então, homens de alma, sensibilidade ainda, nesse cenário são como alienígenas... a difícil comunicação; quem sabe usando sinais, mímica... Esses terão dificuldade de relatar em seus planetas de origem as máquinas de entortar pessoas, as fábricas de estresse. A velocidade sem alvo; a existência sem sentido.

O Senhor, que fingem honrar no Natal, veio para salvar almas; como não existem mais, parece que o trabalho acabou.

Na verdade, há muito trabalho. A poesia dá seu sangue para salvar almas da coisificação; Ele deu o Seu, para salvá-las da perdição.

Não que a pressa em si seja um mal; mas, se nos voltamos ao alvo errado, se torna pressa de morrer; O Ministério da Sabedoria adverte: Futilidades cegam à realidade; se correr, saiba para onde.