Breve análise do poema “Mudam-se os tempos, Mudam-se as vontades”, de Luís Vaz de Camões
A presente dissertação objetiva fazer uma sucinta análise do poema “Mudam-se os tempos, Mudam-se as vontades”, do poeta português Luís Vaz de Camões, com o intuito de explicitar sua estrutura interna (temática e tensões poéticas) e sua estrutura formal (esquema rimático e esquema métrico), além de buscar contextualizar a escrita do poema com o período ao qual pertence – Renascimento.
A primeira observação que cumpre fazer relaciona-se com a estrutura interna do poema, isto é, com o seu conteúdo. Com relação a sua temática, é possível concluir que diz respeito às mudanças que ocorrem na vida com a passagem do tempo, o que se evidencia ao longo de todo o poema.
O sujeito poético fala sobre as mudanças que vão se sucedendo no mundo, o que se comprova no primeiro quarteto: “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, Muda-se o ser, muda-se a confiança, Todo o mundo é composto de mudança, Tomando sempre novas qualidades”; na natureza, o que se constata no primeiro e segundo versos do primeiro terceto: “O tempo cobre o chão de verde manto, Que já coberto foi de neve fria”; e nele próprio, terceiro verso do primeiro terceto: “E em mim converte em choro o doce canto”. Nessa linha de pensamento, é possível salientar que o tempo, as vontades e as pessoas estão em constante processo de transformação, à medida que as circunstâncias se modificam.
Com relação às tensões poéticas, pode-se inferir que elas são verificadas no decorrer do poema, tais como mágoas (terceiro verso do segundo quarteto): “Do mal ficam as mágoas na lembrança”; saudades (quarto verso do segundo quarteto): “E do bem, se algum houve, as saudades” e tristeza (terceiro verso do primeiro terceto): “E em mim converte em choro o doce canto”.
Com relação à estrutura formal do poema, seu esquema rimático obedece ao esquema ABBA, ABBA, CDC, DCD. Seu esquema métrico é o de um soneto, isto é, composto por dois quartetos e dois tercetos, contendo versos decassílabos.
No que concerne ao período em que o poema se insere – o Renascimento, pode-se destacar que esse amplo movimento cultural, econômico e científico que surgiu na Itália em fins da Idade Média e rapidamente se espalhou por toda Europa, tinha como panorama os avanços científicos que proporcionaram as grandes navegações; a revolução comercial, devido ao estabelecimento do comercio com o Oriente; a nova concepção do homem, visão antropocentrista; a retomada dos valores clássicos greco-romanos; a passagem da tradição feudal para o mundo burguês; o questionamento de algumas práticas da Igreja Católica, etc.
Nesse contexto, surge o movimento literário Classicismo, expressão do Renascimento, que reflete um espírito novo mais centrado no ser humano, e que tem como uma de suas principais pretensões o predomínio da razão sobre os sentimentos.
Tendo em vista esse panorama, é possível verificar características no aludido poema de Luís Vaz de Camões que refletem as influências desse quadro, como por exemplo, a linguagem, sóbria, sem excesso de figuras; a busca da universalidade e impessoalidade, ou seja, a temática do poema (a passagem do tempo) é universal, expressão de uma verdade que transcende à esfera individual; além do fato de a linguagem buscar ser mais objetiva, e não mais impregnada de sentimentos, o que também pode ser verificado no poema, pois apesar do eu - lírico utilizar uma linguagem subjetiva, emocional e sentimental, ele também se norteia pela razão e pelo equilíbrio, mantendo sua subjetividade dentro dos limites da estética classicista, isto é sem exageros ou extravasamentos desnecessários.
Tendo em vista o exposto, conclui-se que qualquer manifestação artística é influenciada pelo período em que se insere, ou seja, ela pode ser considerada um reflexo de uma determinada época.