Cores Vieram

Era tudo tão claro, sabe? Daí a pouco, eu saía da fantasia, e logo via a realidade. Mas todo mundo falava que era tudo tão fantasioso... Essa realidade era tão fantasiosa. Mas, como assim? Então saíamos da fantasia pra voltarmos à fantasia? A gente acordava, e o céu era tão verde. Aquele verde musgo, que, o normal era fazer-nos sentir nojo, mas não, a gente sorria quando olhava pra esse céu verde musgo. Daí, as árvores cor salmão, meio vermelho, meio rosa... meio salmão.

E a gente andava, um, dois, três quilômetros de pura areia, daquela areia cinza, que mais parecia pólvora limpa, sem fluxo nenhum de maldade. Mas a pólvora, na verdade, era totalmente azul. Areia cinza, pólvora azul. Daí lembrávamos que nem precisávamos usar da pólvora. Todo esse colorido, todo esse arco-íris fantasioso, fazia-nos lembrar que a pólvora lembra guerra, e a guerra lembra preto e branco. Não que o que branco ou o preto fosse desprezíveis, só representavam a falta, quando juntos.

Então eram cores, e a gente. A gente que era gente, de pele lilás, não pele beje. Beje era a cor do nosso coração. Que coração mais beje. Beje lembrava amor, paixão, sangue.

Eu era de cores, mas não era de ferro, era apaixonado por Melissa. Nossa... Melissa... Lembro bem dela. A cor de seus olhos era puramente branco. Era difícil encontrar gente de olhos brancos, geralmente vinham de olhos amarelos, ou, no máximo, rósio. Mas ela tinha seus olhos em totalidade branca. E seus cabelos? Ah, sorte minha conseguir lembrar de seus cabelos, sorte minha, pois era só mais serotonina pra mim. Seus cabelos eram castanhos. Sim, castanhos. Estranho, né? Ah... que delícia encontrar cabelos castanhos assim. Totalmente castanhos. Já é difícil encontrá-los loiros, quanto mais castanhos.

Daí, ainda acordados nessa tal realidade fantasiosa, dessa vida cor de vinho, dessas vozes azul petróleo, dessas noites marrons, cor de madeira, dessas letras verde primavera, desses dias laranjas e dessa história branco fumaça, a gente acaba percebendo, sem muita sapiência, que a gente só faz uma vida preto e branco se quiser.