A Saída
Acordo assustado.
Um sonho com pesadelo me acordara.
Temo estar anestesiado.
Será que toda a dor costumaz
E a insanidade deste mundo
Expulsou para sempre a sensibilidade que me restava em mim?
Talvez o coração já não queira
Sofrer pelo o que já se derramou tantas vezes
E atormentar a pobre mente
Deste moleque inocente
Que enxerga na escuridão
A luz que lhe foi arrancada tantas e outras vezes.
Será que na dor encontrou o gozo?
E na tristeza, a sua verdadeira alegria?
Talvez um suposto refúgio
Um lugar seguro?
Levaram a de mim
Por inveja e maldade ostentadora
Mas acordo e percebo que nada me dói
Nada me assombra ou me assusta.
Nada me machuca mais?
Será que o desencanto levou toda a esperança fragilizada do meu ilusório encanto?
Enquanto o amor é tirado de mim
Enquanto essa loucura não tem fim
Eu me vejo caindo num infinito redemoinho
Profundamente escuro e sombrio
Mas eu estou silêncio.
Caindo em minha dor anestesiada pelo medo.
Congelando o meu coração pouco a pouco
Eu já estive aqui milhares de vezes
Aqui eu me reconheço.
Sou levado por estas águas escuras e raivosas
Cheias de veneno e ódio
Temendo algum trauma
Eu fecho os olhos.
E deixo o corpo fazer o seu percurso.
Eu estou sem respirar
Mas não tenho medo.
Sei que posso encontrar a saída
É só suportar e esperar
Em silêncio
Em segredo.
Os infelizes têm ouvidos atentos.
Seja ilusão
Seja devaneio em meio à agitação das águas
E por dentro
Eu permaneço sem respirar
E quieto
Agachado e abraçando os meus joelhos
Eu permaneço.
Espero o fim chegar
Chegar à largada ou cair de vez não faz falta
A vida é uma teia de quedas em vôos livres
Nada mais me surpreende.
Nada mais me chateia.
E dentro do redemoinho eu vou
Numa velocidade asfixiante eu percorro
O meu caminho que é o fim ou o meio?
O frio do mar me abraça
Sinto o cheiro da Senhora da Morte se aproximar
Eu sei.
Desespero.
Eu respeito minha natureza.
Calado,
Deixo a fúria das ondas gritarem:
O ser humano fracassou
E toda sua ambição o matou
E sua alma evaporou-se junto às fumaças tóxicas
Que todos vocês criaram para nos matar
Para nos calar.
E quando tudo parece não ter mais jeito nem saída
Nem a esperança de uma faísca de luz parece me reanimar
Eu vejo uma pequena luz a metros de mim
Será que irei me salvar?
Então eu sou expulso das Trevas
Mas a idéia da liberdade me traz angústia
O que será de mim sem ela?
Sem amor, para quê liberdade?
Para morrer de tristeza?
Então acordo outra vez
Mas sorrindo.
De graça ou cinismo eu não sei.
A vida tem estas nuances
Uma hora você se acostuma
E ficar preso ou ter liberdade
Dá no mesmo.
Há armadilhas em todos os cantos para nos pegar
Nos prender ou nos amarrar.
Quem acredita que é livre,
Delira em nuvens de algodão no ar.
Viver não importa.
Existir é enxergar.
E enxergar dói, marca.
E sangra sem chance de uma cura
Para uma dor que só dói porque se pensa demais.