A VIAGEM

O vento passa com seus dedos afiados, e sem pedir licença desalinha os meus cabelos.
O mesmo vento, balança cada folha da jabuticabeira, em cujo tronco, estou recostada.
O entardecer se adianta, e borda no céu, rabiscos alaranjados.
Ali, em paz, ouvindo os pássaros se despedirem de mais um dia, vejo que, eu também, há muito, me despedi da juventude, e há pouco, adentrei o caminho do envelhecer.

Busco prescutar-me: será que estou confortável nessa nova (velha) etapa da minha vida?
Parece-me que foi ontem, que eu me aninhava, no colo acolhedor do meu avô. E, no entanto, hoje, sou eu a aconchegar ao colo, o meu neto.

Nesse momento, os dedos compridos do vento, novamente passam, pelos meus cabelos, e me dizem: "ninguém tem poder sobre os ponteiros do tempo".

Debaixo da frondosa jabuticabeira, me encolho e recolho.   É, como, se eu voltasse ao aconchego do útero materno.
E, quando regresso da viagem de dentro de mim mesma, o dia  já se faz noite. Tudo tão rápido, como num piscar de olhos.
Na mesma velocidade acontece em mim, a chegada da velhice, que pouco a pouco se apodera do meu corpo.

(Imagem: Lenapena)
Lenapena
Enviado por Lenapena em 11/09/2014
Reeditado em 11/09/2014
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