PODER PARTIR



 
     Tudo o que eu queria era poder partir... Não há como... Não há para onde...
     Então, é ficar... Deus! Deus! Meu Deus! Não há como nem para onde partir...
     É preciso ficar... É preciso ficar... É preciso ficar... ficar... Nenhuma partida possível... de nada nem de mim... nem de ninguém... Senhor Meu Deus! Ajudai-me, Pai, neste ficar sem saídas, neste completamente sem saídas ficar. Ficar... continuar a pagar todos os preços do ficar... E não apenas eu... Nunca apenas eu. Meu Deus!
     Alguém dirá que em nenhum lugar eu poderia partir de mim... É verdade, mas, se eu pudesse partir, geograficamente partir, talvez também de mim pudesse, ao menos um pouco, me anestesiar...
     E a escrita, essa coisa dantesca-paradisíaca, que não permite anestesias... Este sempre céu-inferno da escrita... que tomou o lugar da vida, pela impossibilidade de quaisquer outras escolhas... E vendo a dor dos companheiros de jornada e de desditas e de des-ditas... E minha mãe... Minha mãe... Não me adivinhes, mãe. Não me adivinhes. Não me adivinhes. É tudo  o que te posso e devo pedir.
     Poesia, por que me tomaste? Por quem me tomas, Poesia? O que fizeste da minha vida, Amiga minha, minha inimiga mais íntima... O que fizeste e o que fazes  das nossas todas vidas...