CARTA ÀQUELE QUE VI NASCER

Antes de você nascer estranhamos o nome que sua mãe te deu. Quando te vimos pela primeira vez foi impossível não nos encantarmos pelos seus longos cílios, sua cor e para nossa surpresa o nome antes tão diferente lhe coube perfeitamente, pois combinava com tanta beleza.

Costumavam me dizer ser pelas crianças que vemos o quanto envelhecemos e nunca imaginei que essa realidade me chegaria com tamanha rapidez: Filhos, casamentos hoje fazem parte da vida daqueles que há pouco tempo eu via entre brinquedos,desenhos e cadernos escolares.

Você era uma dessas crianças com as quais eu convivia e tento entender onde foi que você se perdeu, mas me é doloroso: Os feriados de ano-novo,você ainda criança, o mascote que acompanhava meus pais quando, no auge da minha adolescência eu só fazia reclamar das nossas viagens à praia e sua ansiedade infantil que nos divertia não abandonam a minha memória mesmo quando vejo a sombra que você se tornou.

Talvez outra pessoa sentisse vergonha em cumprimentar alguém cuja vida foi tomada pelo vício, mas eu não.Insisto em te dizer oi mesmo que seus olhos denunciem degradação, desistência.

O lindo bebê que você era foi sequestrado por uma droga que me foge à compreensão e nos devolveu um homem transformado, que merecia uma vida adulta digna,estruturada e hoje parece apenas sobreviver com o que lhe resta de dignidade.Queria tanto lhe mostrar as fotos que não me deixam esquecer quem você era, mas guardo-as, tentando confortar meu coração.

Ver os meninos e meninas que me cercavam crescerem e se tornarem homens e mulheres de bem não me traz medo do tempo que insiste em passar. Mas te ver assombrando a própria existência me apavora, me entristece. Perdoe-me, mas não consigo permitir que nossos laços familiares se arrebentem sendo que eu apenas queria que você não tivesse se afastado de nós.

D.SConsiglio

Débora Consiglio
Enviado por Débora Consiglio em 31/08/2014
Código do texto: T4944156
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