Sou a mesma água
Alguém diz o teu nome à janela, alguma forma de avisar-te sobre o tempo lá fora - agora chove e as águas insistem em espatifar-se sobre a terra úmida e cheirosa. Lembro-me que você me disse amar os raios dos sóis, mas quem sois vós para ter essa real afirmativa? O hélio esquenta e dói. Queima a pele ressequida. Estarrece-se diante da poeira cor de tangerina escorregadia pelo pescoço. - Pode falar, eu sei que estás pensando nesse momento. Que sou a louca desprovida de sentimentos. Diz, abre a tua bocarra e grita. -... "Olhe, preste atenção na chuva, ela cai e geme ao tocar na terra, ela chia, ela descortina as esdrúxulas esferas das gotas renováveis que por ventura alisam a minha testa e o meu corpo, vês?" Pode agora adorar os sóis que, contrário à minha vontade, queimam a sua pele já tão dolorida. Não sentes que quero ver-te molhado? Sem o guarda-chuva, sem a capa moribunda e sem as galochas? Quero que sintas o quão úmida sou junto à essa chuva. E o quão quente posso ser perante a enchente dessas gotas desviadas pelos meus dedos andarilhos, que enquanto toca os teus lábios, avisa-os que sou a mesma água.