O Menino de rua do descaso
A larga chuva da noite, de vez em quando um clarão. O escuro da noite esconde os motivos que sempre escondem o sorriso da vida.
Os passos dele são quase parados, refletem o estado de inanição, são vítimas empurradas de casa pra fora, entrando nas portas da rua aos empurrões. Por mais que o seu corpo chore, está sempre procurando a razão, de dia no sol e na noite na escuridão.
Tão sozinho e sem sossego, anda por ruas e por becos em busca de alguém que apresente pelo menos, um pequeno filete de luz. Na noite sem vagalumes, a tristeza e o queixume são eternas companhias na selva de pedra injusta que ao precipício conduz.
Se tiver uma luz que o ilumine, só poderá vir de fora, pois a lua que existiria dentro do corpo de alguém, nele não vai ter não, essa luz já foi embora. Se o mundo é tudo isso que o cerca pelas ruas, ele vem pedir arrego, que retirem essa carga sua, pois ele é como a água que rola das enxurradas, sem previsão de futuro, pois sempre morrem mais cedo.
Só parte do seu lamento apavora o cidadão, que vive também assustado por toda essa imensidão, onde fracos e oprimidos, desempenhando a missão, de sempre trabalhar duro, depois entregar tudo que tem para o ladrão.
Ser criança hoje em dia vivendo sem educação, é uma sina que o tempo não dar jeito meu irmão, se não tiver pai e mãe que possa lhe encaminhar, vai ser criado no tráfico, no meio do seu veneno. Amanhã não será mais um desprezado? Vai sofrer menos?
Duvidamos que em pouco tempo, a situação se reverta, pois quando o sol está quente ele põe as mãos nos olhos para amenizar o clarão. Da mesma forma é que hoje fazem as autoridades daqui, sem nunca pedir perdão, com tanto rei na realeza, dizem que está uma beleza, e que não é bem assim. Tão ingênuo nesse lado, o menino na balança, nunca vai ter peso algum.
Um carro apita a sirene, tem alguém jogado ao chão, sofrendo as humilhações nos seus prantos e sua dor. Ele foi atropelado pela vida e o destino, sempre quis ser um menino que brincasse e estudasse saindo da condição de abandonado nas ruas, e virasse um cidadão.
Alguém levanta e diz “pobrezinho do menino, levanta dai garoto, senão um carro de pega”. Ele levanta e segue seus passos sem direção, vai seguindo pela estrada, seguindo pelo rumo da ilusão, a fome está muito forte e ele não vê solução. Com uma arma na mão, pede ao povo atenção, pois é o que tem momento para suprir a falta de um coração.
Ainda andando pela rua, rouba aqui e rouba ali, a chuva vai lhe molhando, mas ainda há de um dia poder secar, podendo andar cercado de vida, um perigo na cidade, atrás da felicidade. Ele sabe que elas existem, mas não tem nenhum acesso.
Esse é o menino de rua, que nasceu sem esperança. Seu pai é o abandono e a mãe é a dona ingratidão.
Enrolado num jornal antigo, as notícias velhas lhe agasalham. Tem medo de dormir naquela noite chuvosa e pela manhã não acordar. As notícias são as mesmas sujeiras que os donos do poder escrevem sobre mansões e festas, viagens e compras internacionais, enquanto ele está ali, molhando no meio da rua, com as chuvas e com as lágrimas, as páginas úmidas do papel.
A tempestade aumenta. Fica ali mais encolhido, num pranto chorado e sofrido, molhado e amargurado, olha pra todo lado, seus olhos não enxergam ninguém.
Não sabe explicar que ao acordar de manhã, a chuva deu uma trégua, o sol vem se despindo, um pedaço de pão alguém vem trazendo, é o “pão da madrugada”, e ele acorda sorrindo.
Afirma: - Ainda estou vivo.
E depois pergunta:
- Estou vivo?