Choque de realidade

ando como quem já não suporta acordar, tá tudo certo,

já me segurei por demais em tantas bengalas,

que respirar é um ato enfadonho, e de fato só tenho isso ,

a cada amanhecer de susto, num pesadelo que insistem em

chamar de vida.

quanto blá blá blá sobre fé, felicidade, humanidade,

liberdade... poxa isso cansa sabe... isso é utópico para um mundo

tão real de causar espanto. de resto é prantear sobre meus restos de tudo onde o dia é um minúsculo espaço de tijolos e cimento,

um certo tom de cal para clarear o escuro amarelado

que entra pelos vãos e frestas que me impedem de desejar

abrir os olhos.

viver é deixar-se enganar, quase num desespero crível,

nessa insanidade toda, que aprendi de modo lírico,

a entender de (dor) ...

consigo ainda alguma claridade nos pensamentos

e queria mesmo desligar essa máquina sem fio,

tomar um treco paralisante qualquer... porém sem dor.

fiquei com o que me era absolutamente dispensável,

e fui saqueada brutalmente sem chance de escolher ou reaver

aquele bem que ouro nenhum era capaz de comprar.

tá, tá certo... sobraram-me alguns bens adoráveis...

mas justo aquele? há algo justo nisso?

hoje só sei perceber quão justa é a saia que tenho que vestir

noite após noite, desejando somente não acordar amanhã,

e ter que desejar bom dia para meus fantasmas.

"Deixo sempre uma flor ao lado porque os jardins já feneceram"

Cássia Da Rovare