"Caminhando e cantando"
A passeata dos professores do dia 24 de Julho foi inusitada. Caminhamos do Colégio Central até o Corredor da Vitória. Na trajetória sentir uma imensa necessidade de caminhar sozinha no meio da multidão, sem a companhia dos velhos e lindos amigos de jornada. Andarilhava entorpecida sob o sol escaldante. Fisicamente eu fazia parte. Eu era a multidão. Mas eu não era mais meu corpo. Assistia a tudo como se fosse um filme. A multidão parecia não ter uma direção, um ponto final. Cantarolava as músicas de protesto como forma de manter contato, de fazer parte.
Caminhando e cantando observava as pessoas que não estavam naquela marcha. Uns aplaudiam, jogavam confetes, outros, simplesmente olhavam. A multidão agradecia o apoio com sorrisos e aplausos. Num momento de delírio vi pessoas descerem dos seus apartamentos, trabalhadores abandonando seus serviços, comerciantes fechando suas lojas, as pessoas nos pontos de ônibus, no engarrafamento, os policiais, os moradores de rua, a imprensa, os estudantes e seus pais, todos passavam a seguir a multidão. Diversas marchas se juntavam a marcha dos professores. Vinham de todos os lugares. Caminhando e cantando juntos. Agora tínhamos uma direção...
Caminhando e cantando voltei pra multidão que continuava sozinha diante de uma sociedade apática e alienada. O sonho histórico de Paulo Freire não se fez real. Cantamos o Hino Nacional e cada um voltou pra suas casas, seus problemas, seus amores e solidão. Uns foram sucumbidos, perderam-se no caminho. Outros fizeram a passagem e muitos resistem e lutam. A multidão se dissipou e tudo normalizou. A rotina massacrante engole qualquer poesia e todos ainda esperam um sinal...