ROMANCE EM PARIS
A noite chega com suas lâmpadas incendiárias.
A chuva cai indiferente, e os cafés recolhem
casacos na noite molhada de Paris.
Me aqueço no La Pax, Boulevard des Capucines.
A mesa é rústica e as batatas fritas estão ávidas
exalando-se, alimentando-se de almas destituídas.
Um livro se espalha, descontraído, num colo macio.
O girassol, no canto, entende o caminho dos poetas.
Ela me comove, perco o folego, seu olhar é armadilha.
Me apanha pela mão, graciosa, sorri no canto dos olhos.
Ela é reta, estreita, me aperta contra o peito;
me iludo, me confundo, me afundo nas zangas.
Apanho estrelas, possuo beijos azuis
tenho sonhos dourados
pensamentos translúcidos...
Os cafés pensantes não dormem na madrugada
faça chuva, faça sol, faça neve sou cativo dela.
Tem nela um desquerer que me desquer amar!
um amor que me enleva
um beijo que celebro
o ciume que renego
o orgulho que me cega
o egoismo, a queda!
É manhã! Sigo pelo Boulevard du Montparnasse
no La Coupole me dizem coisas, ela nega.
Não quero, não posso ver o óbvio, o vil;
que importa o vazio, ao seu lado sou completo.
Finjo nossa aventura, vou sonhando ao sol da tarde.
Sob o céu intenso de nossos lábios saem palavras doces.
Seu perfume acompanha borboletas e flores de agosto.
O relógio conclui suas horas com lágrimas, fel e brasas.
Em sua partida surgem no céu meia dúzia de estrelas.
O poeta não subverte, não comete desatino, abriga-se.
não espera um dia sequer
nas curvas da sua boca
nem à sombra dos seus cabelos.
Paris tem malfeitores à espreita armados com traições.
Em nós uma pátria feita de esperança tomba madura.
Tua voz agonizando, seu perfume consumido, seu corpo
estendido; o inverno parisiense repetindo-se, sem vida.
Paris quase calma
Paris quase sonho
Paris quase nossa
repetindo-se Paris
repetindo-se em
Paris, repetindo-se.