PAUSAS...
Estou ferida. Feriram-me. Um momento em que sinto-me vazia. Incapaz mesmo de escrever uma só nota na "música" que compõe a vida. Minha alma esvazia-se e meu coração, quase parando, bate baixinho e em silêncio, doi. E doi em sinal de que ainda existe. Minh`alma se derrama em prantos e choro baixinho, doído. Tantas lágrimas me confundem o olhar e mal posso ver o papel, meu confidente, que embora já meio úmido, aceita minha dor em forma de palavras...sinto-me só e vazia. Não consigo pensar em nada, nada mesmo que me possa tirar deste entorpecimento e ruína. Sinto-me como se estivera na berlinda da vida e a sinto sinistra, numa versão "Beleza Americana", em que tudo acontece às avessas. Sou hoje uma flor despetalada e largada em um deserto qualquer, quente e distante, onde somente a tempestade se dá conta de mim e me arrasta à mercer do tempo e do vento; sou hoje uma partitura rasgada em mil pedaços e, ao menos neste instante é-me verdadeiramente impossível juntá-la, recompô-la; sou uma ânfora partida, cujos pedacinhos jazem em um canto qualquer à espera - quem sabe - de um artista singular, que com muita maestria a consiga restaurar... uma pausa enorme faz-se em minha "composição". Perco o ritmo, quebro a pena. Tudo se desfaz diante de mim. O amor se esconde, a vida também; a batuta cai de minhas mãos. Já não sei retomá-la. Sou um maestro sem tom para a próxima nota...minha orquestra se cala, tudo emudece. A "menina" está quieta; a Emilia dorme; a poeta...essa está sem pena, nem de ouro, nem de prata, nem de cinza...(FÊNIX)? Resta apenas a mulher desvirtuada de seu "AMABILÍSSIMO JEITO DE ESCREVER".
A vida é feita também de dor, apesar de você, nobre desconhecido.
Mas...eu sei que a composição da música de nossa vida é um processo lento e doloroso. Existem as PAUSAS...e nelas, - pensamos - não existe música. Mas elas ajudam a fazer a música. Às vezes murmuramos por termos que calar as nossas vozes diante das pausas; nem sempre compreendemos que as pausas existem não para interromper o processo de nossa criação, mas às vezes - e quase sempre -,para torná-lo mais preciso; para que ao ferirmos a próxima nota, o façamos com mais firmeza e com maior zelo e refinamento. Nesta composição não podemos transgredir sem corrermos o risco de desafinar a próxima nota. A NOSSA MÚSICA É A NOSSA VIDA.
O que faria um maestro diante da pausa? Pararia ele a orquestra? Por certo que não. Continuaria com a mesma precisão, apenas com mais cuidado até alcançar a próxima nota. Assim segue a nossa história. Entre erros, pausas e acertos.
Essa música, é claro, cessará um dia. Mas até lá, é dever meu, (nosso) fazer(mos) "brotar" música das pausas, do silêncio e até da dor...
Bethoven, ao escrever sua nona sinfonia, estava surdo. Poderia ele ter interpretado sua surdez como uma pausa definitiva. E se assim o tivesse feito, eu, você e o mundo inteiro, seríamos mais pobres e mais surdos, por nunca termos conhecido a "próxima nota" de tão sublime canção!
E por falar em Bethovem, lembro-me muito de uma frase sua que diz: "NÃO HÁ REGRA QUE NÃO POSSA SER VIOLADA POR AMOR AO BELO". Coisa linda! Quando penso nessa fala, me conforto um pouco, porque não posso ser mais transgressora do que sou quando penso em ti. Todas as regras, todos os lacres, todas as "máscaras" são violadas por meu pensamento, quando aqui te tenho. Para ti dispo minha`alma numa atitude cúmplice de confiança, simplesmente por saber que compreendes minhas "insanidades poéticas".
Não, não se assuste. Sou apenas assim: meio normal, insana, meio prolixa, meio muda, meio surda; meio menina, meio mulher, meio poeta. Mas na essência do mais das vezes, sou apenas um ser que AMA tresloucadamente o belo e que segue tentando encontrar a próxima nota para sua "música".