VÉSPERAS DE ESTRÉIA
Adormeci sobre as areias ardentes de uma praia paradisíaca e acordei à beira de uma falésia. Assustada, tentei me equilibrar sobre a margem devorada por um mar bravio, mas suspendi os movimentos no medo de um passo em falso, da queda livre, do corpo fadado ao ir e vir das ondas quase subterrâneas.
Agarrei-me a realidade e me salvei com as percepções divididas entre o pavor e o prazer. Noite entrecortada. Sonho recorrente. Dormi e despertei em sobressaltos. Translação de marés. Caminhei nas orlas do oceano da noite, debrucei-me na janela, vi estrelas, vi chãos... Pensei em palavras com corpo de terra. Mas infiel às prosaicas intenções, quase gerei uma metáfora...
Ao fechar os olhos, o sonho se repetia com força e angústia. Ao desvendar as fantasias, as inquietações se multiplicavam como impressões cambiantes de um caleidoscópio. Por que tanta insegurança? Por que flutuar nos abissais significados?
Entre acordes da partitura do precipício, o grito sufocado no medo suspenso no silêncio de sombras denunciava o rubro pensamento: uma abscissa entre o ponto obscuro, focado na armadilha inconsciente, e a projeção do plano onírico.
Amanheço com a exaustão dos abalos sísmicos a ondular o dia com as turvas ondas. Encontro-me entre portas entreabertas. Ainda véspera, ancorada à margem do oceano da estréia, sinto a maresia denunciar as falas e os gestos. Tento recompor as naus de idéias e aportá-las nos portos seguros cotidianos, mas oscilo nos declives da ansiedade.