Natal Desencantado II

O tempo de natal é-me triste na realidade, de tão pesaroso que me aparenta ser, no meu âmago infértil.

Sou homem de dias simples em catadupa, uns atrás de outros, iguais de tão inócuos e banais que os faço parecer.

Atingi o supra-sumo da indigência social, consegui o feito inédito de começar a ter sérias incertezas na minha conduta niilista comportamental, será porventura demasiado segregada socialmente.

Não sei porque insisto ainda em enviar as boas festas a alguém, deve ser com certeza apenas masoquismo bacoco da minha parte.

Às vezes penso o que diabo se cruzou nos céus, por terdes um dia ousado atravessar o meu caminho, talvez nenhuma razão em especial, apenas um acaso aleatório mínimo no caos existencial vigorante.

Mesmo assim o que seria de vós descobertos sem a minha áurea negra, nos dias de hoje?

Mais felizes e realizados seriam sem certezas, ausentes sim da dúvida.

Desculpem-me o atrapalho que vos dei e infringi, com o meu perpétuo bocejo.

Abençoados sejais, os que abandonaram este barco fantasma em que navego.

Pois entre a vida e a morte, eles escolheram arriscar viver.

Opções duma vida tal e qual o vibrar quântico, numa teoria das cordas antropomorfizada universal.

A vida estará bem-feita, tanto para quem a consiga viver plenamente ou não, o primeiro tira partido do saber viver intrinsecamente, o segundo cai num enfastiamento crescente ao longo da vida tal, que a morte é a única salvação e bênção possível e desejada.

Alguém escreveu um dia: "O trabalho poupa-nos de três grandes males: tédio, vício e necessidade."

Infelizmente pela minha parte, isso não se verifica, pois no meu caso só consegui juntá-los todos numa matrioska sensorial, em que todos encaixam uns nos outros, indissociáveis, num grande bocejo de enfado espiritual e agastamentos fúteis de tão irrelevantes.

Quem insistiu em me acompanhar, relevará para a eternidade a infinidade do entendimento exacerbado, apreendido neste nosso cruzar de sonhos estéreis, que tentam apaziguar a sede insaciável de respostas inescrutáveis.

O natal acabou por agora, finalmente deixou-me a dormitar à noitinha, no meu imenso sono pesaroso em que nasci.

Lx, 25-12-2012

Paulo Gil
Enviado por Paulo Gil em 02/07/2014
Reeditado em 04/07/2014
Código do texto: T4867728
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