Máquinas
Estou cansado do barulho das máquinas
Este barulho que me invade os sentimentos
Infecciona-me
Perturba-me
Engana-me
Enlouquece-me.
Estou cansado de falar por máquinas
Quero rosto a rosto
Olhos nos olhos
Boca a boca
Abraço quente e apertado
E não emotions coloridos, sem vida.
Congelados.
Estou farto disso tudo
As máquinas que falam
Que tomam o meu lugar no espaço
Que contam minhas mentiras
Que fingem ser o que eu não sou
Que amam roboticamente
Que nos afastam
Que nos mantém sempre sós.
Estou cansado de ser mais uma máquina.
Hoje eu não quero tocar no celular
Não quero ligar o computador
Não vou atender nenhuma chamada
Nem responder nenhum comentário.
Eu careço de verdadeiros afetos
Eu careço de humanidade
De fato.
Hoje eu não quero ceder a essa loucura
Morrendo numa cama fria
Nessa imensa solidão
Que queima o meu peito em agonia.
Hoje eu não quero participar dessa artificialidade coletiva
Que não abre porta alguma em minha alma
Que em suas asas negras nos capturam
E nos mantêm reféns de cliques sem futuro.
Salas de conversa nos convidam
Para uma ilusória presença
De repente
A ilusória presença se desfaz
Sem um “adeus”, um “tchau”
Um “até mais”.
Eu me sinto como uma mercadoria
Mas sem valor algum nesta vasta tecnologia
E no Reino das Indústrias
Eu absorvo toda a sua fumaça tóxica
E torno-me um produto estragado
Um parafuso velho e enferrujado
De todas essas redes sociais e virtuais que nos conectam.
E então eu vendo minha mão-de-obra
Como um produto vencido
Como um brinquedo torto
Como um robô cheio de defeitos.
São tantas redes para nos conectar
Que desconectados somos
De quem está do nosso lado
De quem realmente se importa conosco
De quem devíamos conectar os nossos verdadeiros afetos
E cultivá-los para não morremos nos tempos frios
De escuridão
Ou de tristeza imersão.
Somos todos,
Máquinas então?
Robôs de uma geração congelada em seus sentimentos?
Presos em abas, em janelas sem vida
Em páginas cheias de solidão?
A superficialidade nos seduz
E nos capturam
E imersos nessa vasta escuridão
Vamos seguindo
Sem questionar essa tal razão de sermos assim
Tão apegados ao que não possui sentimento algum
Tão escravos de uma tecnologia que só nos domina a psique
Tornando-nos reféns de nossos medos.
Acreditando que tudo que é moderno é verdadeiro
Vamos nos afogando nesse mar cheios de vírus
De pessoas sem rostos
De pessoas que fingem seus sentimentos
Toda hora
Todo o tempo.
E imersos nesse delírio coletivo
Somos alienados de nós mesmos
Perfeitos para essa eterna ilusão
De que somos amados através de máquinas
Que não sentem
Não se tocam
Não se compadece verdadeiramente
Mas nos envia um emotion comovente.
Sedentos somos,
Por toda essa ilusão?
Fadigados estamos de tanta realidade
Que desesperadamente nos jogamos em qualquer buraco virtual
Sem fim,
Sem chão?
Num espetáculo então vivemos
Cheio de desejos e medos
Carências e desesperos
Somos canções sem notas
Sem melodias
Histórias sem enredo
Alimentando-nos de tanto vazio
Para parecermos inteiros?
Inteiramente conectados
Para nada em dar em nossa angústia
Para nada, além do infinito
De nós mesmos.