Sobre um passado presente

Quando leio os poemas que fiz para você

Agora assim distante no tempo do “nós” me pergunto

Se foi isso tudo tão tanto

Se valeu a pena o suor, o sangue, as lágrimas

De coração magoado, respiração suspensa

Observo nós dois pelos cantos das frestas por onde já não entra quase mais sol

Antes quando éramos festa e comemoração

Peito aberto para o que pintasse e desse

Não tínhamos essa agonia, mas só a urgência de estarmos nós, nus, sós

Passou tanta água debaixo de nossas pontes que a fortaleza que guardava a pureza do sentimento grande deixou umas muitas pedras rolando morro abaixo

Mortalha de uma história torta hoje meio estragada e um tanto melancólica

O dito na raiva, na pressa, no instinto ainda pesa e dói feito a navalha quando atinge a carne

Nesse instante tudo é passado

Muita coisa agora que é só poeira úmida incrustada nas fibras dos nós não desatados

Poeira engordurada que só com muita dificuldade se dissolve

Sujeira que de tão grudada demora uma outra vida inteira para limpar.