Terra Morena
Por: Anderson Du Valle
Penso Belém cidade morena, pra mim seria bom se Grândola fosse, sim, Grândola, aquela vila morena, terra da fraternidade. Diferentemente da vila do Alentejo me incomoda a revolução de tuas mangueiras surradas, cravos são espinhos gigantes de metal introduzidos em tua pele rude, nada tem a ver com as flores de Portugal. Mas continuas tua saga de assimilação, carregando teu povo que de tão simples é hostil a teus encantos, não se pode mais atribuir tantos a tão pouca circunscrição. Ergues imponente monumento a fartura em teus portos e rios, nada se assemelha a áridas paragens, só não consegues transmitir isso a quem te cuida, ou não te cuida, teu povo farto, farto ficou quando tudo “fartou”.
Penso Belém de viajantes noturnos em catraias, açaí no porto para saciar toda a carência. Tem quem se atreva a compartilhar, poucos conseguem, mas muitos em ouro e gordura sim. Tuas sobras não sobram, fome não é tua sina, os teus festejam essa desordenância criativa que transforma migalhas em manjares, que recebe mais gente do que cabe em cada casa, mas que se abrigam e se aconchegam sob o manto de Nazaré.
Penso em Belém da chuva intermitente, de gente resistente quase reticente, mas essencialmente renitente. Penso em Belém daqui em diante sem a distância abissal dos coronéis a seus currais, sem a interferência de quem te agride e de quem te fala mal. Penso em Belém de um povo híbrido, Índio, preto e caboclo, mas de topete europeu, como a Paris que já foi d’ America um dia. Penso em Belém de lindo caboclo cheiroso, de morenas auspiciosas e suas saias rodadas. Penso em Belém de beleza e revolução, de jambeiros que avermelham o chão, de mangueiras floridas em cada quintal, sem cravos ou espinhos, como a Grândola de Portugal.