Meus armários

Dizem para eu esquecer o passado,

seguir em frente.

Jogar fora toda a lamúria e construir um novo começo.

Dizem muitas coisas....

como se eu andasse errado,

como se não houvesse um preço em cada pecado.

Existem monstros lá atrás,

não julgo quem o faz, mas,

não posso deixá-los todos trancados no armário.

Tenho medo de que apesar de bem lacrados, um dia,

libertem-se todos, pra minha agonia e me atropelem

e interpelem meu possível bem estar.

Posso ouvir a rebeldia dessas memórias,

a socarem as portas de madeira grossa,

boa, porém não imune ao tempo.

Ninguém sai impune de um arrependimento.

Talvez haja quem possa.

Talvez um cofre resolva.

Mas, em minha casa simples, de poucos cômodos,

tudo ecoa,

amores, abraços,

lembranças em cada canto costumam falar mais alto.

Porém quando tudo cala,

quando acaba a festa,

quando preenchido de falsa alegria me deixo cair no sofá da sala,

o som da melancolia me alcança.

Sinto-os a me olharem pelas arestas.

Não há mais dança.

Não há mais par que possa disfarçar essa inquietude.

Não lembrar, é se esconder,

faz a alma capengar e envelhecer, cada vez mais rude.

Não será essa minha herança.

Subo as escadas pela primeira vez em anos.

Caminho trêmulo e decidido.

Caminho de volta,

pois o que interessa, é revirar, remexer,

saber que a alma ferida é conseqüência da vida

e não importa a sua ciência,

a arte da vivência é conceber que não há final,

nem começo,

há apenas uma porta,

e outra porta e mais outra porta.

Raphael Moura
Enviado por Raphael Moura em 25/04/2014
Reeditado em 23/12/2014
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