"Morena"
"Aquela luz que emana de seus olhos, agora, haveria de apagar-se. Nada de fases da lua ou namoro na folhinha. O sol haveria de esconder-se de meus caprichos, para me maltratar. As músicas haveriam de perder um pouco de seu canto, quem então haveria de me encantar? Até o poeta haveria de perder a inspiração em meio as decepções causadas.
Mas o que haveria de ficar são os espaços entre as dedos que não mais haveriam de se tocar. O vazio entre duas bocas que falam demais quando deveriam, apenas, se beijar e calar. Mas logo haveria outro alguém a ocupar meu lugar. Então, porque os cabelos brancos haveriam de brotar?
O peito sempre carece de respostas demais, quando deveria apenas sentar e escutar. Mas e daí, ela não haveria de voltar...
Assim, mais pensamentos haveriam de me torturar, além do que ficou dela que não haveria de passar. Ela não entende bem meus motivos de ir, mas talvez, e só talvez, saiba que eu fui mesmo querendo ficar. Fui ali, na fila do pão, comprar, quem sabe, uma nova opinião ou razão.
Volto quando precisar, volto se chamar-me. Chama baixinho, como em algumas de nossas trocas de calor. Só não esquece de chamar.
Olha eu aqui, mal fui, e já quero voltar.
Talvez meu coração seja maior que os outros sentidos de minha razão.
Ou apenas a cor que ela joga em minha vida seja mais bonita pelas manhãs. E no fundo eu acredite que seja amor, não apenas medo da solidão.
Eu que não queria solta-la obriguei-a me soltar. Agora só voo, nunca a repousar. Nela fiz meu ninho, e sem ninho não posso ficar. Ela há de entender e perdoar, se por descuido o telefone tocar. Ela há de retornar. E como quem não entende a gravidade de se machucar, com voz mansa ei de declarar, que a saudade anda a me matar.
Ela há de entender se eu, por acaso, procura-la em alguma dessas ruas longas e finitas.
Se ela for esperta há de me parar, virar-me a costas e esquecer. Mas esperteza não envolve amor, ou envolve?
Em ambas as partes ela há de voltar e me amar.
Ou quem sabe esquecer-me neste fim que eu ousei procurar."