O que posso eu...
O que eu posso fazer se estou eu tão absorto em meus pensamentos e as noites e os dias se sucedem devagar sem parecer ter um fim nesse lugar ocupado por tantas gentes que como eu, homens e mulheres, circulam absortas também à cata de soluções para os seus problemas cotidianos, enquanto pelo mundo aos milhares os ratos travestidos de homens entopem esgotos das metrópoles
insólitas
O que posso eu diante da fúria desenfreada do mundo por prazeres mundanos e se pelo menos um ano eu fico a ver navios que vêm e partem de qualquer lugar levando consigo minhas nítidas impressões de fracasso e, se nem por um momento posso tocar com minha mão o colo da minha deusa
inspiradora.
O que posso eu dizer das peripécias conservadoras dos que se escondem atrás de vergonhas inúteis quando se mostram o tempo todo por tudo que fazem sob quatro paredes. E o que dizer daqueles que se esfolam em penitências que se esfarelam ao atravessar a primeira rua, quando esbarram na verdadeira face de Deus esperando Dele compaixão, mas o que veem é só o preconceito de seus filhos mais caros
O que posso fazer diante das minhas pretensões mais humildes, se eu sou o primeiro a elegê-las prioritárias em detrimento da verdadeira razão de estar neste mundo, esquecendo que o que realmente importa na vida é não se importar com as coisas pequenas e que o que quero é tão grande que parece impossível tocar... em face do mundo e das pessoas com as quais estou
e me misturo
O que posso fazer se não sou eu e o que há em mim é tão estranho
Que parece o mundo o meu quintal e minha janela
E nem sequer me sinto nela
Minha grade
Minha migalha
Minha mazela.