O VIAJANTE


Ele percorria os campos à procura de um indício,
uma pequena referência que o fizesse voltar ao tempo,
a um longo tempo passado.
Observava a vegetação, os animais pastando
e ouvia o canto das aves,
a batida de uma porteira.
Ouvia o trote de tropas, não tanto quanto outrora.
Galos cantando nos poleiros...
Buscava em cada som da natureza,
nas montanhas, nas planícies, nos açudes,
nas trilhas, nas vertentes e nos vales,
uma lembrança.
Contudo sentia aquela sensação de vazio, algo perdido.
De algo que a memória não conseguia trazer de volta
e o que o coração descompassado teimava em buscar...
Em que esconderijo do tempo estaria escondido o que
ansiosamente buscava para torná-lo em paz consigo?
Não conseguia vislumbrar a criança que amassara
com os pés o barro da olaria;
que percorrera as sombras frescas dos cafezais,
desarmando arapucas.
O tronco onde costumava sentar-se apodrecera e
era contra esse apodrecimento que lutava,
para conter as palpitações do coração.
Como compreender esta sensação indelével
que o dilacerava?

O curral desaparecera,
desaparecera as tilápias do açude
e o mugido do gado não era mais o mesmo.
Compreendeu então que ele próprio mudara,
que era preciso encontrar, não o seu passado,
mas o momento presente.
O novo homem que surgira.


Do livro Todos os Dias São Úteis - Edição do Autor - 2009


Edição esgotada.