[Transporte da Noite]
Se um sonho não quer partir de mim, assim que amanhece o dia, o que é que eu faço?! Como nunca sei bem o que fazer [fora das partes que sei da Matemática e da Física], eu faço que já fiz antes, várias vezes: continuo a carregar dentro de mim aquela noite anterior, quando o sonho "me" veio.
E foi isso que eu fiz quando a bela e sensual "Lourdes" me visitou em um sonho maravilhoso e intensamente erótico... Um transporte na noite! Vivência tão real, tão real que, ao sol quente, eu levei a noite dentro de mim: saí às ruas procurando por ela! Ainda agora, quando escrevo o que já escrevi tantas vezes, vejo os seus olhos castanhos, úmidos, fixados em mim, seus lábios colados aos meus, nossas mãos... ávidas, ansiosas, buscando, abrindo as roupas, buscando... doidas, doidas de desejo!
Tanto tempo, tanto tempo, e ainda hoje, a minha loucura vai ao ponto de ter a memória do timbre da voz dela... que, certamente, é a voz de alguém da realidade, mas não importa: para mim, ficou sendo a voz da "Lourdes" mesmo!
E naqueles dias, dei asas à loucura: escrevi o conto mágico - "Ah, Lourdes, onde anda você?" - pois afinal a loucura é apenas um modo de ser humano! No sonho, havia três de mim: e o mais velho dos três é que encontrou a Lourdes, e contou o vivido aos outros dois "Carlos", um deles era um engraxate, e o mais novo, um menininho-poeta, o "Calêla"!
Eu pensava que, escrevendo, alguma catarse, algum alívio eu teria; mas vejo que não! Agora, volta-me a dúvida de antes: se "Lourdes" existe, se é tão real, onde anda, onde vive? Em algum lugar de Minas? Será?
Não importa; pois para mim, Minas não é mais... Minas é só mais um sonho que não parte de mim, e às vezes, invade o meu olhar de surpresa, vindo num aroma, num sabor, como o da broa-de-fubá que eu comi hoje à tarde, aqui no Desterro!
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[Desterro, 03 de fevereiro de 2014]