DEVANEIO

Algum andarilho cansado e sem destino certo, disse que o caminho se faz caminhando. É verdade. Todos os dias somos compelidos pelas forças que se opõem à gravidade a sairmos da inércia. Alguns homens menos inquietos permanecem inertes durante toda a vida, como pedras enormes coladas no chão, servem de tropeço, de escora, de ponto de referência. Nunca produzem nada de bom. Nascem pedra e morrem pedra, e pior: morrem impedindo a passagem de outras árvores e o nascimento de tantas flores. De toda sorte sempre haverá um cabrito interessado em subir nessa pedra.

Alguns lobos menos felizes andam metendo medo nos outros que querem sorrir, se divertir, brincar consigo e com suas histórias, talvez, quem sabe com suas próprias mãos e pés. São a seu turno pouco inteligentes e gostam muito do poder. Vivem sempre nos bastidores amealhando algum troco sob ameaças de uivos públicos.

Alguns bons ladrões constroem em torno de si uma cidade murada com tudo o que pensam ser útil e necessário dentro. tornam-se impenetráveis a primeira vista. Sua fuga é por porões secretos e túneis pouquíssimos visitados. São introspectivos, impiedosos, avaros e sem alma. Não sentem dor, não sentem frio, não sentem nada. São cheios de si e nunca precisam de ninguém.

Alguns pintados são mentirosos e feios. Estes são os que menos aprecio. Não gosto de gente feia por fora ou por dentro. Muitas vezes a beleza interior é vista por fora e aí melhora o padrão do transeunte que segue desarrumado e sem lastro, sem perfume, sem banho, sem tosa, sem dinheiro no bolso. Estes últimos até fazem bem pros mundos.

O mais engraçado é que as pedras, os lobos, os bons ladrões, os pintados, estão em todos os lugares e são admirados e gozam de tudo, usufruem da nossa paciência, encantam os mais românticos senhores de estado e são prestigiados por homens de ouro e níquel, especialmente por aqueles industrializados em bancos de praça.