Choro

Choro

Geralmente não choro, (não é coisa de homem...).

Quando choro, choro só e escondido, choro muito minhas emoções abissais,

de doer a garganta e a nuca, por tentar controlá-lo.

Choro isolado, sem nenhum gesto, sem nenhum som, só as lagrimas e alguns soluços. Não recebo simpatia ou compreensão – mas como fazem falta...

Nas poucas vezes em que chorei na presença de pessoas estas acharam muito estranho,

teatral, um despropósito disseram, pois nunca me haviam visto chorar...

No entanto, comentam que chorar faz bem, alivia a alma dolorida.

Mas é difícil chorar, principalmente aqueles choros que comprovam

covardia, fracasso, saudades..., os mais sofridos.

Os sofrimentos já estão codificados pela sociedade,

como forma de enquadrá-los no cínico, no egoísta, no tranquilamente falso

e pretendido agradável panorama geral.

Saudade é passado, fatos que já deviam ter sido metabolizados,

assimilados e não relembrados e revelados com emoção exagerada,

para quem não tem nada a haver com o ocorrido.

O chorar comedido, deixando as lagrimas escorrerem e a voz embargada,

em ocasiões especiais,

é choro elegante, mas que não satisfaz.

Choro bom é aquele convulsivo, babento, gritado, acompanhado de tremores,

mas este é tomado por atitude deselegante e histérica,

o sofredor perde sua razão de sofrer e passa a ser uma criatura vulgar, inconveniente...

Ser taciturno e triste, macambúzio, já é um sofrimento incomodo.

Ao acrescentar a vulgaridade de chorar alto, em publico, mesmo intensamente arrasado,

por uma dor muito pessoal,

é sofrimento adicional: desmoralizante e impróprio.

Cada um tem seu sofrimento que há de ser respeitado e compreendido.

Então se comporte, parecem dizer, e conviva segundo as normas sociais.

Não se torne desagradável, pois não és o único a sofrer ou és diferente dos demais?

Mas sou diferente, merda.

Minha dor é só minha e ninguém é capaz de avaliá-la.

Quero sofrer e chorar como me satisfaz, à minha maneira,

amparado, consolado, compreendido pelos que me são próximos,

sem ser necessário explicar porque choro,

ou então, por favor, me deixem só, situação com a qual já estou me acostumando.

Não importa se misturo, aos fatos ocorridos, questões teológicas, históricas e filosóficas, pois minha dor é totalizante e impar, complicada.

Se se quer continuar a conviver com algumas pessoas,

uma situação inexorável que posterga o tiro na cabeça,

é preciso prestar atenção para não se perder a compostura,

que também tem suas regras comportamentais,

sob pena de se perder o poder de comunicação e de se passar a ser, até,

um espetáculo curioso: - vejam, como está chorando!

Um desvio do comportamento normal elegante

e não um irmão que, chorando, implora por compreensão, companhia e amparo.

Tenho ensaiado e treinado para ficar silencioso, conforme o ambiente e a ocasião.

Deixo, cada vez mais raramente,

as lagrimas rolarem e os soluços se sucederem,

sabendo que as pessoas que me oferecem a mão amiga e o abraço confortador,

não conhecem nem se interessam em conhecer o que se passa comigo.

Geralmente fingem que percebem a minha desorientação e solidão,

dispensando explicações longas e tediosas, acompanhadas de

perturbadores sons e gestos, que conformam minha vida triste.

Deixem-me chorar como quero, sozinho ou no meio da multidão, sem criticas,

apenas cercado dos consentidos leves sorrisos educados ou expressões compungidas,

como dita a etiqueta autodenominada de solidária.

Tratemos, pois, de observar as regras aceitas de conduta.

Não devo aborrecer ninguém com a minha presença chorosa...

Cada um na sua... Não perturbemos os outros com os nossos problemas,

pois, todos, mais fortes do que eu, sigilosa e elegantemente, também já sofrem demais,

só que aprenderam aceitar a vida como ela se apresenta...

Assim se parecem os educados impávidos, os intocados pela vida,

os membros do grupo majoritário,crescentemente dominante,

dos felizes, dos realizados e modernos adaptados ao ambiente.

Parabéns, que bom!

Eu não: - continuo na procura do choro feliz,

aquele da esperança e da paz reencontradas,

na certeza do amor transmitido pela tranqüila contemplação da plenitude

da eternidade, que me aguarda, recompondo-me comigo mesmo, e, então,

poder sorrir e compreender, um pouquinho só, a infinitude alegre e completa da

presença plena de beleza e da carinhosa e permanente misericórdia de Deus,

que há de me abraçar, fazendo esquecer sofrimentos que se tornarão banais,

(sem mais serem lembrados e não causando dor), apontando o instante permanente

de uma vida completa e feliz,

- sem lagrimas, sem choro...

Eurico de Andrade Neves Borba, Ana Rech, Natal de 2013