Ela entrou na sala, sentou-se confortavelmente e,
como se estivesse só, começou a falar:
Tenho me sentido estranha, sinto uma sobriedade mórbida
com momentos de profunda reflexão, momentos estes que se intercalam
entre o sentimento de esperança e da falta dela, somados a uma tristeza tão sutil,
mas de presença forte e constante que já não dói, mas faz-se sentida,
pois pesa o coração e cada dia ele vai ficando mais e mais cansado.
Não tenho sentido vontade de falar, conversar, nem tenho paciência para ficar escutando.
A sensação é de que o silêncio me conforta e com isto tenho orado mais,
tenho lido mais, tenho lido até a bíblia. Minhas conversas atuais são mais monólogos
com "Deus", monólogos, pois não tenho escutado "Ele" falar.
Acredito que tem sido assim porque não tenho perguntado nada mesmo,
tenho é desabafado e pedido força, sabedoria e fé, e "Ele" me olha e acena com a cabeça.
Sinto como se eu estivesse mudando por dentro. As coisas que estou sentindo me mostram
o quanto tudo aqui tem estado vazio e fugaz, e vou percebendo que tenho dois mundos paralelos,
o só meu e o que vivo com o restante do mundo, um mundo de pessoas que parecem
não perceber o quanto tudo isto é nada.
Às vezes a paciência foge de mim de tal forma que desejo que de repente
a morte apareça e me abrace, mas também às vezes o simples cantar de um bem-te-vi
me faz querer viver pra sempre ou virar passarinho.
Não tenho conversado com as pessoas sobre como tenho me sentido, e elas também não estão interessadas em saber como as outras se sentem.
Hoje em dia elas querem das outras, sorrisos, favores e piadas, cada um tem os seus problemas,
então os dos outros não nos interessa, por isto venho aqui,
te pago, você me ouve, não diz nada, e eu sigo com o coração um pouco
mais aliviado para suportar estes dias estranhos.
Eu a chamei pelo nome, olhei para ela e disse que tinha acabado a sessão.