EM PRISÃO DOMICILIAR
NO INÍCIO DA MADRUGADA DE 28 DE DEZEMBRO DE 2013
Personagem kafkiano ele vive, há anos e anos, em prisão domiciliar, sem direito a banho de Sol. Não é político corrupto nem laranja; não é contrabandista nem traficante de drogas (...); não se lembra de, em dia de sua vida, ter cometido crime ou infração grave de qualquer natureza.
Ele vive em prisão domiciliar, sem direito a banho de Sol. Está morrendo por falta de Sol, este pobre sujeito respeitador das leis, esse sujeito decente que tem, desde a mais tenra idade, o hábito de acolher os direitos alheios como se foram seus.
Pobre sujeito decente a morrer em prisão domiciliar, sem direito a banho de Sol. Pobre sujeito a morrer de saudade do Sol. Sem direito a habeas corpus, sem direito a revisão de pena, sem direito a revisão de si mesmo.
Pobre sujeito a morrer, sem direito ao Sol; sem direito, também, a hora nenhuma de ser e de estar realmente só, de poder descansar-se um pouco de si só, em si, só. Ele, que há muito não sonha com qualquer liberdade maior do que a poder ficar sozinho na prisão domiciliar, por alguns minutos que seja: já seria alguma coisa. Certamente, alguma coisa seria. Afinal, liberdade plena é para nenhuns e ele nunca foi um sujeito ambicioso.
Pobre sujeito a morrer por falta de Sol; a morrer, por tanta falta de si; a morrer por saber que quase ninguém no chamado mundo real pode realmente compreendê-lo. Realmente quase ninguém, quase ninguém, quase ninguém. Julgá-lo, sim. Condená-lo, também. Pobre sujeito que ama, a despeito de tudo, mas, quem consegue acreditar que ele ama, quem? No chamado mundo real, quase ninguém.