NÁUFRAGOS VIAJANTES

Em flamejantes ondas naus advindo

de mares distantes, pátrios cidadãos

meus antepassados sempre aqui lembrados

de tempos bravios há muito findos

Netuno!

rei dos mares e tridente à mão

ordena aos seres submersos

Vão-te à superfície olhai ondas espumosas

e trazei homens fugidos de regresso

Naus perdidas sob céu nebuloso

nem Zeus pode do naufrágio aqueles salvar

Ó, deusa amante de pai celestial

que podes com tua beleza o poderoso enganar?

Mar calmo em calmaria a alma descansa

que ao fundo corpo já sem vida oferenda receba

náufragos moribundos que vida sobeja

Debita à luta que mar revolto incita à lança

Réquiem composto em honrosa homenagem

sacia-te, ó, viajante destes mares em descoberta

e deita-se sob a sombra à praia ainda virgem;

tateia a areia e recolhe o ouro que rancores desperta

E ao horizonte o sol já sem brilho

mar calmo em calmaria navega viajante alerta

que águas turvas já esquecidas em passadiço

ainda imberbe atirou-se ao mar corpo noviço

E à proa sob atrozes ondas

olha à distância o noviço viajante

presa ao mastro de nau estrangeira

a deusa de cauda anfíbia e canto torturante

Sem nada à terra que os prenda

mar e oceanos percorridos e procelas vencidas

naus rompendo ondas e tufões

temem aos deuses mais que brasões

Em noites calmas e estrelas arriba

do convés pobres almas lançam juras

à deusa e amores em portos esquecidos

atiram à noite louvas de luas futuras

No porto destino de todo viajante

a alta corte corre em depósitos mercantis

ouro e prata conquistados a muito sangue

nem e igreja condena a benção ultrajante

Ao fim e ao cabo de toda a querela

pobres mais pobres ficam sempre à espera

de mão que desça sobre ombros e cabeças reais

posto que ao mar só adentra quem o mar tolera

Náufragos viajantes

de tudo que do mar já se disse

perdoe, ó, mar e viajantes a renda

dos poetas que oferecem suas prendas