Protelações

Ontem à noite, arma na mão, pensei no rumo definitivo.

A luz, incidindo no cabo de madrepérola antigo, lembrou-me uma outra igual, numa fotografia de um outro tempo.

Pousei o definitivo na mesa e fui às gavetas, à procura da luz que um dia incidira da mesma maneira. Talvez casar uma luz com a outra, antes da partida.

Mas, das gavetas vieram, para a despedida, outros tantos guardados, uns mais claros, outros mofados e, em sendo tantos, tantos casais de luz separados! E fui juntando, juntando, e depois veio o sono e, dormindo, sonhei que despertava. E foi bom o sonho.

Agora , na pausa do almoço, recordo que hoje de manhã, atrasado para o trabalho, deixei gavetas abertas e mesa descomposta, para logo mais à noite.

Penso em como são raros e rápidos os momentos de completa lucidez, e concluo que a vida é mesmo estarmos distraídos.