O sorriso do gato de Alice
Sempre gostei de gatos.
Quando era criança, em casa tínhamos um gato, dito e achado vira-lata. Um dia fui tentar pegá-lo e como recompensa fiquei com alguns arranhões nas mãos. Por ter má-cicatrização da pele, ainda hoje carrego as marcas daqueles arranhões. Ficaram como se fossem tatuagens em minha pele.
Bem, esse episódio poderia ter-me causado um trauma, ter-me tornado avessa aos gatos, mas não foi isso o que aconteceu. Continuei gostando desses felinos. De certa forma sinto um tipo de identificação com os gatos. Estão sempre na deles, independentes. Também gosto de ficar no meu canto, observando. Talvez eu tenha um pouco da alma dos gatos.
Nunca mais tive gatos em casa, mas não por falta de gosto e sim por falta de oportunidade.
O desejo ter gatos dorme aqui, dentro do peito, à espera de sua realização.
Quero ter três gatos, que chamarei de Eça, Chico e Saramago. Homenagem a Eça de Queirós, Chico Buarque e José Saramago, três paixãoes que acalento há tempos.
Gal Costa tem um disco intitulado “O sorriso do gato de Alice”. Foi dele que retirei o título para esse texto que agora escrevo.
Outro dia assisti ao filme “Alice no país das Maravilhas”, a versão que tem o Johnny Deep no papel do Chapeleiro Maluco. E lá estava o gato, sorrindo escancaradamento para Alice.
Sei que gatos não sorriem. Pelo menos não os gatos da vida real, mas sou imaginativa o suficiente para poder vislumbrar, assim como Alice, o sorriso do gato.
Chico Buarque escreveu: “Saiba que os poetas como os cegos podem ver na escuridão.” Bem, sou poetisa. Também sei ver na escuridão. Além disso, saberei ver o sorriso desenhando – ou imaginado – nas faces de Eça, Chico e Saramago, meus futuros gatos.