Bairro da Paz é pura poesia e coração
Conheci, em novembro de 2013 (para um bate papo com poetas) e, em julho de 2015 (na oficina de Audiovisual do Boca de Brasa), uma das fronteiras desta cidade desigual. Salvador é loteada, esfacelada, murada por todos os lados. A má distribuição da renda nacional se reflete aqui de forma violenta. Enquanto prédios de trinta, quarenta andares brilham ao nascer do sol, bairros inteiros são apartados, escondidos pelos espigões. E com avenidas que mais parecem rios envenenados - como definiu Enrique Peñalosa, ex-prefeito de Bogotá, quando de sua visita à capital baiana -, esta cidade mais parece uma teia de aranha com becos, vielas, ruas apertadas, e muito abandono.
O Bairro da Paz é um exemplo desse abandono. Nascido de movimentos de ocupação, em 1988, na época da Guerra das Malvinas (Inglaterra X Argentina), o bairro foi batizado, inicialmente, como Malvinas. Por conta da garra das pessoas, de paz, que queriam e querem, apenas, ter um lugar para morar e trabalhar para sustentar seus filhos, rebatizaram a comunidade para Bairro da Paz. A região é a cara de outras partes da capital, onde as pessoas vivem em bairros-dormitórios, viajando, literalmente, todos os dias, para trabalhar e estudar no centro e em outras localidades de Salvador. Mas o bairro não se deixa isolar. Tem uma vida própria, com um comércio movimentado, igrejas de todas as denominações, moto-táxi, restaurantes, supermercados, farmácias, barzinhos e todo tipo de estabelecimento comercial. Possui linhas de ônibus, mesmo precárias e um povo trabalhador, lutador no dia a dia desigual desta cidade desigual.
Apesar da desigualdade que se nota sem fazer esforço, o bairro vive e sobrevive como uma cidade dentro da cidade. Aliás, parece mesmo um outro lugar, uma outra realidade. Caminhar pelas ruas ainda é possível, sem o barulho de trânsito e sem a pressa da região central de Salvador, que parece caminhar sempre rumo ao esmo, com rapidez e sem olhar para os lados. No Bairro da Paz, ao contrário, o tempo dá para tudo, ainda bem. E tem muita arte ali.
Arte e educação, pessoas do lugar e de fora, que se juntam, se irmanam, em um trabalho belíssimo, como é o exemplo do Espaço Avançar, onde se pode ler livros de autores consagrados e novatos, tem oficina de música e de teatro, tem orientação religiosa e educacional, tem poesia nas gavetas, mentes e bocas da juventude. Agora em 2015, o Boca de Brasa ocupou o bairro com oficinas de Criação de Textos (Rap, Música, Poesia), Audiovisual, Música (home studio), Elaboração de Projetos, Danças Urbanas e Teatro de Rua. Eu participei da oficina de audiovisual, pude interagir mais com as pessoas, conhecer Bárbara Caldas, André Leandro, Marcelo, Miguel, Carlos, Valnice, Tom, Roque, Bira Mendes, Mateus, Patrick, Jeferson, Jéssica, Genilson Franco e muitos outros e outras.
Que tal participar do mais novo espaço poético de Salvador? Não passe a 80km por hora na Paralela sem diminuir a marcha e conhecer o Bairro da Paz e o Sarau da Paz, que volta a gritar poemas para os céus de Salvador...