Zero hora e dez minutos
Estranha forma de sonhar. Dormir sem sentir que o sono tomou o corpo. E acordar assustado porque batem na porta para algum atendimento.
A nudez incômoda. Do outro lado,da outra margem, alguém me observa com curiosidade e não sei o que espera.Veio porque queria alguma coisa, além do motivo exposto.
Palavras sobre o filme que eu nem assistia, apesar da televisão ligada, sonífero prescrito à paciente insone, queixando-se de cefaleia; comentário sobre a beleza das misses e um copo de água gelada antes da pressa de sair. Da minha parte,apenas os olhos, os gestos, o silencio : ecos e não palavras ou ações concretas. Devia estar dormindo e certamente ainda durmo, mesmo se pareço desperto. Justamente porque pareço desperto, o sono e o sonho se confundem e a realidade fica fora do quarto.
Levou minha solidão multiplicada pela dele e não me deixou senão a interrupção de um filme paralelo ao que era exibido.E ambos continuaram no escuro, sem som e sem imagem.
Sanatório São Paulo,Salvador,Bahia
03/06/1984