As mulheres sem cabelo.
Esvai-se o tempo,jovens mais jovens do que eu se vão, em vazios profundos sem queixas, sem duvidas apenas partem, sem deixar sonhos pra trás.
Também não me queixo, Admiro os lenços, as tocas, os adornos das mulheres sem cabelos, elas ficam iguais, somos iguais sem pelos. Eu admiro cada sorriso, as contagens progressivas de suas vivências de suas experiências no escuro, as que trouxeram à luz dos meus olhos embaçados. Cada uma conta a história das suas cicatrizes, dos seus laços, dos seus nós em suas gargantas, de todas as coisas que foram silenciadas e que voltam agora como um grito, contido mais tão evidentemente forte quanto desejo enorme de vida.
Eu sigo, já nem me preocupo com meus cabelos, ou com meus pelos ou com a minha pele, percebo que o que sinto é mais inteiro, não tem mais o pavor da febre, ou da nausea. Fica ecoando em mim esses sons e esses enfeites que veja n'alma delas. Todas sangram, inevitávelmente, todas se revelam tão únicas, tão ternamente afeiçoadas as suas mazelas, e nenhuma delas quer o passado, apenas o futuro. Não há mais tempo para remoer amarguras, ou faltas, ou metades
É tudo uma questão celular, elas são átomos que se agrupam, são apenas uma.
Seus esposos e filhos conversam noutro canto, falam de futebol, de trabalho, delas eles não falam, não lamentam, não dizem nada, convenço-me que eles também estão convencidos da força delas, eu me rio, trocamos olhares e elas sem esforço me falam de coisas que apenas suponho saber, enquanto observo cada turbante, cada perucas, laços, arranjos primaveris em suas cabeças sem cabelos ao vento...Elas me ensinam a remanejar a minha poesia, noutro verbo que ainda não conjugo em todos os tempos, subjetivamente vivo cada emoção que elas declinam de forma realista, intensa, vívida... tão vívida que consigo afagar suas chagas e suas almas ao vento.
Cristhina Rangel.