Das metáforas
- Das metáforas
A noite é fria. Os últimos portões já se fecharam.
Ao longe, apenas a silhueta do trem que chegava.
A estação onde está sempre lhe pareceu acolhedora, desde o dia em que chegara. Queria acordar ali todos os dias.
O trem se aproximava cada vez mais. Não sabia se queria partir. “Por que outras estações se essa aqui parece tão confortável e tranquila? Por que sair de onde se está?”. Vinha rápido. Era possível ver um pouco da paisagem interior e exterior daquela máquina curiosa, tão bela e cativante. Viu por um momento em sua mente a imagem de outros lugares possíveis. Imaginou-se feliz ali dentro. Desejou os lugares onde aquele trem poderia levá-lo, quis estar lá. Quis, profundamente. Mas relutou.
A passagem não custava caro, não cobrava mais do que o normal. Cobrava apenas o que todo trem cobra.
Decidiu seguir com tudo aquilo, mas atrapalhou-se na hora de tentar embarcar. Estava preso às próprias correntes que colocara ali. Não deu tempo de retirá-las, ou talvez o esforço tenha sido pequeno.
Foi pequeno, o passageiro.
O trem, grande, passou.
Ao longe, agora apenas a silhueta do trem que partira. Ao passageiro, restou sua sina e contradição. Um diálogo com sua própria sombra, projetada na parede da estação que, agora, já lhe parecia estranha e pouco agradável.
Carregado de otimismo e vida, juntou os poucos pertences que tinha. Acendeu um cigarro e olhou para seu relógio. São quatro e meia da manhã. O brilho do sol deve voltar a qualquer instante, levando o frio e a noite embora. Talvez encontre o trem novamente. Talvez encontre outra estação, onde passem outros.
É hora de se livrar das correntes e caminhar pelos trilhos, outra vez.