Dias tensos

Ah! Como andam densos os meus dias! Poderia até cortar à faca a mistura que respiro, mesmo enquanto durmo. Em consequência, é diluída e sensaborona a frugral sopa que me sirvo para alimentar o que me resta de sensibilidade. É certo que conto, neste momento, com o doce e fragrante suporte da minha mais-que-tudo, que a tudo renunciou para passar uns dias na quente redoma de vidro, minha domus nesta esburacada, vilipendiada e estranhíssima urbe.

Esta manhã, vejam só, por razões que não sei explicar, o meu espírito se abriu para apreciar o mais valioso bem que ainda conservo: A vida! Dei em analisar em detalhe, tudo e todos que de repente imagino gravitando no meu em torno, como se eu fosse uma espécie de sol, microscópico em tamanho e poder, mas gigantesco em meu ego subitamente inflado ad infinitum!

Ciente e resignado com o fato de que serei sol de pouca dura, procuro aproveitar os instantes de resplandecência para observar e se possível, descrever, as resplandecências que  me rodeiam e me deliciam enquanto sorvo, guloso, o medicinal momento...

                Em cena, a morena,

                tropicana feiticeira!...

                serena, pequena!

                trocista, amena...

                tropicana feiticeira!...

               Sua pele é tão dourada,

                seu andar, provocação!

                Ela é da pá virada,

                mexe com a garotada

                que aspira ao seu coração...

                E quando a morena passa

                assim tão cheia de graça

                por olhares sempre seguida,

                alegra-se a natureza

                que exulta em luz e beleza

                plena de alegria e vida!