LUA MORTA
Abro a porta.
É noite.
O céu é nublado.
Lá fora há um luar molhado
a se espalhar no meu telhado,
a escorrer pelas paredes,
penumbrando ruas e becos
e espreguiçando-se nas sarjetas.
Há, também, lá fora, um grilo
que, insistentemente,
repete sua monótona cantilena
como se fosse uma lira desafinada
nas mãos de um insano Nero
saudando o grande incêndio
de uma Roma imaginária...
O vento agita a samambaia
que, fora da minha porta,
recolheu gotas da chuva
reteve em suas folhas
e agora atira em meu rosto
afogando-me de repente
em um dilúvio particular
sem arcas,
sem profecias,
sem Noé...
Da minha porta
vejo a lua morta
que na rua torta
sua luz fraca aborta
e em minh’alma absorta
uma saudade aporta
e o meu coração recorta
mas quem se importa?