O HUMOR DE MANUEL ANTÔNIO ÁLVARES DE AZEVEDO (1831-1852) - (MANECO) - EM LIRA DOS VINTE ANOS

AI JESUS! (ÁLVARES DE AZEVEDO)

Ai Jesus! não vês que gemo,

Que desmaio de paixão

Pelos teus olhos azuis?

Que empalideço, que tremo,

Que me expira o coração?

Ai Jesus!

Que por um olhar, donzela,

Eu poderia morrer

Dos teus olhos pela luz?

Que morte! que morte bela!

Antes seria viver!

Ai Jesus!

Que por um beijo perdido

Eu de gozo morreria

Em teus níveos seios nus?

Que no oceano dum gemido

Minh’alma se afogaria?

Ai Jesus!

(Obras, v. 1, 1853 - Lira dos vinte anos – 1ª parte)

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Ai Jesus! É uma expressão de origem portuguesa que significa: “Ai que medo!”, “Ai que preocupação!”, etc., e logicamente traz o humor todo vez que é pronunciada.

A poesia é composta de dezoito versos, divididos em três estrofes (cinco versos a primeira, cinco versos a segunda, sete versos a terceira), sendo a primeira e a segunda iniciadas com a expressão “Ai Jesus!”.

As rimas da primeira estrofe são: gemo (verbo gemer) no primeiro verso e tremo (verbo tremer) no quarto verso, paixão (substantivo abstrato) no segundo verso e coração (substantivo simples) no quarto verso, azuis (adjetivo) no terceiro verso com Jesus (substantivo próprio) do sexto verso, que é a expressão elencada.

Os cinco primeiros versos são redondilhos (sete sílabas poéticas).

(Ai-Je-sus!-não-vês-que-ge/-mo,)

(Que-des-mai-o-de-pai-xão/)

(Pe-los-teus – o- lhos- a- zuis?/)

(Queem-pa-li-de-ço-que-tre/-mo,)

(Que-meex-pi-rao-co-ra-ção?/)

Por último a conhecida expressão: “Ai Jesus!”, provocativa de humor.

A segunda estrofe, de quatro versos, também redondilhos, com as rimas donzela (substantivo simples) no primeiro verso e bela (adjetivo simples) no quarto verso, no segundo verso temos a rima morrer (verbo) com viver (verbo) do quinto verso. Luz do terceiro verso rima com nus do quarto verso da terceira estrofe.

Fazendo a escansão (separação, divisão em sílabas poéticas) temos:

(Que-por-um-o-lhar-don-ze-la,)

(Eu-po-de-ri-a-mor-rer)

(Dos-teus-o-lho-pe-la-luz?)

(Que-mor-te-que-mor-te-be-la!)

(An-tes-se-ri-a-vi-ver!)

A terceira e última estrofe inicia-se com a expressão “Ai! Jesus!” seguida de quatro versos redondilhos e é finalizada com a expressão inicial. Fazendo a divisão em sílabas poéticas temos:

(Que-por-um-bei-jo-per-di/-do)

(Eu-de-go-zo-mor-re-ri/-a)

(Em-teus-ní-veos-sei-os-nus/)

(Que-noo-ce-a-no-dum-ge/-mi-do)

(Mi-nhaal-ma-sea-fo-ga-ri/-a?)

Na estrutura profunda do texto temos: um jovem poeta que suplica por alguma atenção, talvez um amor sem correspondência (“Que por um olhar, donzela...”), utiliza a expressão para mostrar o seu estado de espírito (esperançoso: “Que por um beijo perdido...”) para encontrar sua amada (“Em teus níveos seios nus?”.

O poeta utiliza para chamar atenção da amada à expressão “Ai Jesus!”, que, além de dar nome ao poema, aparece por mais quatro vezes, demonstrando todo medo e toda preocupação do jovem bardo e também provocando humor quando pronunciada com o típico sotaque de Portugal.

E, no sentido figurado, isto é, o uso das palavras com o significado diferente do que é apresentado nos dicionários, temos: desmaio - que não é desmaiar, expira - que não é morrer, morrer - que não significa morrer literalmente, morreria - que não está relacionado com morte, afogaria - que não é afogar.

Augusto de Sênior.

(Amauri Carius Ferreira)

(FERREIRA, A. C.)