Sinfonia de aniversario

Minha menina coloca suas pequeninas mãos em meus olhos e para que eu não me sinta só no escuro, doa-me a sua vista , me guia pelos caminhos torpes e conta-me historias quando me deito em desesperada posição fetal.minha menina não sabe, mas o tempo nesse quarto passa de modo diferente, de forma que ela não controla tudo, e há tempos em que eu escapo de suas mãos, para ver o sol opaco e frio com meus meus próprios olhos

Mas eu volto, eu sempre retorno para os bracos da minha menina, o sol, perigoso poeta de felicidades fúnebres, me cega e me oprime. Eu digo que tenho medo do escuro, mas eh o sol que atemoriza as minhas noites em claro.

Quando a deixo no quarto só, se distrai com os novelos de lã embaralhados e espalhados que deixei no chão, ela tenta achar uma ponta, um rumo por entre tantos nós, sentada no pé de uma velha que tenta costurar, fingindo desvendá-los, um confortável manto para proteger seus frágeis ossos,  quando fazem isso eu fecho os olhos e recomeço a cantar a mim mesma as canções que minha menina me ensinou, enquanto pequenos gatinhos, que recolhi da rua, brincam e reembaraçam os meu novelos, de forma que nenhuma das duas cumprem a sua missão e voltam para o seus respectivos lugares ao meu lado

Aahh minha menina, volte para casa e me deixe ver para sempre pelos seus olhos, não me deixe ver o sol de novo, não se deixe desembaralhar minha mente,apenas fique comigo e me diga que esta tudo bem., eu não quero sentido e ordem nos novelos que construi, desista de escrever, eu quero chorar feito um recém-nascido que nao conhece o léxico, o choro que fala por si só e que some ao se aprender as primeiras palavras que nos ensinam a mentir, eu quero ser assim, desenho abstrato colocado na parede pra ninguem ver, música feita de ecos pra ninguám ouvir, a existência que o ser humano deixou de ter quando resolveu pensar, entao puxe esses novelos , deixe que eu vá vomitando as minhas coloridas e baguncadas lãs, deixe os gatos embaralharem todos os pensamentos,juntem seus gritosnao meu, absolutamente sem sentido para a eternidade enfermera