O Ladrão de Chuvas

Eu reverencio a chuva. Encantada com as gotas que atingem e avançam sem pudor. Seu som abafado e ameaçador. E quanto mais me proponha a odiá-la, mais ela me convence que não há sol sem chuva.

Chuva mais que encantadora, é capaz de mudar de tom sem perder a linha, sem perder a formosura. Tu és tão sugestiva, mas tão poucos sabem de ti... E não me refiro à condensação ou liquefação, mas seu sentido, tua água, tua vida. Vida que preenche a minha, que me enche de alegria e que me faz ter certeza que tudo muda na vida. Tu, que lavas minh’ alma, queres conversar comigo? Responda com um de seus uivos.

E, nesse momento, tu se tornas bravia e amedrontadora. Acham que és destruidora de lares, dos barracos desformes e mal edificados das periferias dessas cidades. Mas tu és mais. És bem mais que isso. És o que preenche o silêncio de quem precisa de palavras. És a companhia de quem necessita de alguém. És a água que me lava, me preenche e me renova, Tu és a alegria dos tristes.

E eu, eu sou triste, triste não sei por que, mas estou triste. Tristeza acumulada que não precisa ser espalhada. Guardo segredo pra minha confidente. Tu chegas sem aviso prévio e renova tudo o que antes era certeza e, mostras tua grandeza, tua força, por todos os meus lados e de todas as direções.

Sinto-me um ladrão pronto a morrer com flechas molhadas por todos os lados. E tu mostras. Tu escondes. Tu desencadeias e finaliza mais bela que a mais bela das sinfonias. E mostras que não sou nada, que não tenho nada e que não preciso de nada. Que não sou vida. Que desafino como uma criança que aprende a tocar. E que sofro, que desperdiço. Desperdiço tempo. Desperdiço vida. Desperdiço alegria. Desperdiço a chuva.