SEM NADA
Chega a casa no casaco ausente de cor
e pousa os olhos no sofá,
emite um suspiro de fome
e liga a tv para jantar as notícias aos pedaços.
Os talheres cravam o coração ausente
e deliciam o paladar da distância
que aromatiza a refeição.
Bebe o sumo das causas perdidas
na filosofia guardada na mala dos negócios
que se encosta todos os dias ao móvel de pó
que permanece na entrada da realidade.
Pede um café de carinho à voz inócua
que habita o pires da solidão.
Chega-lhe às mãos uma chávena de grãos diluídos
e transformados em deleite fugaz,
sem açúcar de amor e sem colher por companhia
bebe de um trago antes que arrefeça
nas mãos o sabor do tempo.
Levanta-se e entra no quarto do canto da sala
e atravessa o corredor da meditação da pele
na ocorrência dos olhos nas mãos.
Leva as mãos à cama enquanto o corpo se deita
no chão suspenso de sexo sentindo o frio da mármore
que tem o relógio de corda partida na cómoda da decoração.
Adormece despido de fantasia e sonha a realidade em episódios,
sem amor, sem carinho, sem nada…