Imagens de Outono

Imagens de que me lembro,passados num tempo,não muito distante,um solfejo,um alento...

Todos somos reflexos de um universo inigualável de combinações imprecisas,arranjadas num único ponto,o seu ser.

Nesse sentido,somos universos viajantes dentro dum Universo bem maior,o mundo que nos cerca.

Me recordo no meu bairro tantas pessoas singulares,ao passear na rua,logo pela manhã de sábado,sentia o cheiro forte de fumo no ar,era seu antonio fumando um cigarro de palha..-espantando os mosquitos seu antonio?-diziam os vizinhos

e o velho mal encarado que era,abria um pequeno sorriso.

mal o dia despertava e na porta do bar da esquina uma fila de meninos aguardavam ansiosos para jogar no fliperama,ops,agora era uma máquina de video-game,jogo de luta que era a febre daquele tempo.the king of figthers.. um homenzinho franzino,manco de uma perna,abria a porta do bar com ajuda das crianças.

aquele era um horário mágico,ninguém se atrevia a beber cachaça,queriam ver o burburinho das batalhas na máquina.

bem,mas eis que vem ali o sr Pedro,um velho pedreiro que se enveredava na cachaça,mas apesar de tudo,era homem bom,pagava ficha pra molecada quando tinha um dinheirinho,faziam a festa de fato.

dona maria,a mãe do dono do bar,era uma senhora aposentada e generosa,mas de gênio forte.

a tarde quase sempre,trazia petiscos pra turma do bar,que se embrenhavam numa jogatina de baralho,inclusive seu filho mais velho,chamado pelo apelido de Beppo,um aficcionado por jogos,tinha um coração maior que o peito,queria ganhar muito dinheiro pra salvar a familia da falência,e assim,com tantos pormenores que caberiam num livro, todos se esqueciam da vida.

A noite quando ja ficava tarde demais,descia ao bar,e aos mesmos frequeses que habitualmente estavam lá,jogando,expulsava-os!

-vão embora!!não estão vendo que ja passa das onze?seus bando de perdidos!!

todo mundo murchava a orelha,era hora de se mandar,com dona maria ninguém ousava dizer sequer uma palavra.

no dia seguinte a tarde,la vinha ela com os salgados,mandioca frita,etc,não cobrava nada,os mesmos fregueses estavam lá,apinhados na mesa grande de baralho,era seu gosto fazer aquilo.

e a rotina era sempre a mesma.havia um tom nostálgico naquilo tudo,quando um dos fregueses disse:-nunca houve um lugar como esse,com esse carinho e sinceridade,e nunca haverá.

A noite a máquina era para os marmanjos,alemão,zinha,junior,jonathan,entre outros se embrenhavam na batalha virtual.alemão quando perdia colocava a culpa no controle da máquina que segundo ele não estava funcionando...

Nas noites frias de outono no bairro,próximo ao pé de paineira,a molecada se reunia e fazia uma fogueira toda noite,apesar das reclamações do sr Tião,que temia pelo pé de paineira..

a molecada se divertia,faziam pipocas ao fogo,traziam guaraná do bar,ficavam papeando até o fim da noite.

pelas manhãs,duas ou tres senhoras sempre limpavam as calçadas,sem reclamar.

o dono do bar parecia uma pessoa triste,apesar de viver em harmonia com a turma,que eram mais que fregueses,eram quase uma familia.

certa tarde ele passou a ler a bíblia e a encontrar respostas para suas angustias..

o tempo passa e inexoravelmente trás mudanças,ao passar pela manhã de outono no mesmo bairro,não senti o cheiro forte de fumo no ar,não haviam crianças na porta do bar,o pé de paineira estava imenso,mas nem sinal de fogueiras ao redor...

Olhei ao redor meio assustado,as casas haviam crescido,nenhum rosto conhecido.

a tarde me alegrei por um instante,pensando em voltar a rua da alegria,e rever a todos.

voltei andando vagamente pela rua,o bar estava fechado,nenhum sinal de fumaça que espanta mosquito no ar,nenhuma criança na porta esperando o bar abrir.

Algo inquietante atormentou minha alma quando me dava conta que havia passado por ali há tantos anos atrás.

O tempo havia mudado as configurações daquelas tardes de outono,

o sr Antonio,sr Pedro,a dona Maria,o sr Beppo,já não existiam mais,o homenzinho do bar havia se tornado cristão,e agora trabalhava na prefeitura e havia fechado o bar há um ano.

As pessoas que ali frequentavam,se enveredaram por outros bares da vida,deixando uma saudade guardada em algum canto do peito,daqueles tempos memoráveis que não voltam mais.

Tudo parecia frio e sombrio apesar daquela tarde ser de sol quente.

perdido em pensamentos,me dispus a ir embora.

quando ia dobrando a esquina ouvi alguns gritos,meninos e meninas invadindo a rua,no ar pequenos fragmentos da lã da paineira navegavam sem destino,a criançada tomou conta da rua,era guerra de bexigas d água.o tempo passa mas deixa uma herança perpétua dentro de nós,durante nossa existência,as lembranças;uma dádiva de Deus..retomei meu caminho resoluto,

um sorriso involuntário tomou meu rosto,nem tudo tinha se perdido..

Mario B Duran
Enviado por Mario B Duran em 01/05/2013
Reeditado em 02/05/2013
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