[A Infecção do Belo]

O Absurdo é o que há de mais interessante no mundo. O resto é mesmice, repetição sem graça, copia da cópia. Sem o choque do Absurdo para nos despertar do "sono dogmático" [Kant] a vida é uma berdamerda modorrenta...

O Feio é o reverso do absurdo do Belo... é dialética essa coisa: os contrários não se desatam... Brotam, ora um, ora outro, no gume da contradição!

O Feio é usual, está por toda a parte, nas ruas, nas filas... principalmente, está, como sabemos e sofremos, firmemente pousado em Brasília!

O Feio é desarmonia, é quasímodo, é uma violação da proporção áurea, essência da Beleza. A feiura costuma ser o primeiro problema de uma pessoa irritante; a gente deve sempre procurar ser atendido por uma bela pessoa, ou, no mínimo, não-feia!

O Belo, sendo raro, pertence, por excelência, ao reino do Absurdo: surpreende, espanta, "infecta" o mundo ao redor, suscita a inveja típica dos feios: aquela do tipo "sapo que cospe no vaga-lume"! Se eu não tivesse lido essa fábula, já teria cuspido em tanta beleza por aí... Ainda bem que eu filosofo, e me cuido... mas sei que posso até me apaixonar por uma bela criminosa!

Sendo eu um feio, nunca curti inveja, mas sempre sofri da terrível infecção do Belo. As alamandas ao sol me infectavam terrivelmente... também me infectava a beleza das rosas que eu roubava do jardim da praça para deixar na janela da namorada... Sendo eu um feio, causo males, sofro todos os azares do mundo... Remédio infalível para a feiura: a morte... Falar nisso, eu a espero desde quando me vi, isto é, desde os meus cinco anos...

[Se tivesse que viver do que escrevo... eu já não seria mais feio!].

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[Desterro, 23 de abril de 2013]