Amor...pérola negra

Ostra sou. Nasci um pouco ostra: estranha, fechada em meus sentimentos e emoções. O que eu trazia em mim, ficava comigo.

Como não me abria para o mundo, não conhecia o sofrimento de fazer uma pérola de amor. Claro, as pérolas só são produzidas pela dor, pelo arramamento, pela ferida aberta... e isto, eu não tinha.

Reservada, um pouco tímida ao falar de mim, ia levando a vida.

Achava-me diferente de minhas amigas: belas, com pernas grossas, bumbuns empinados, cabelos esvoaçantes ao vento. Quando eu saía de casa, sempre me sentia a concha mais feia, por isso irregular, incapaz de produzir uma bela pérola, pois fechada para a vida, jamais permitiria que houvessem feriadas, muito menos cicatrizes em meu coração.

O tempo foi passando, o madurecimento chegando e a percepção de que o mundo estava ali ... que para amar, eu deveria estar aberta a ele, sem medo... apenas me entregar e me deixar seduzir... E comecei a deixar que a água entrasse pelas pequenas frestas que eu me permitia abrir- e como foi bom sentir a água entrando - tudo diferente, maravilhoso...

As passagens foram ficando maiores e o amor entrou; porém, junto com ele, fui rapidamente preenchida por infinitos grãs de areia: da ilusão, da saudade, da não compreensão, do ciúme... tudo... tudo... me ferindo, me trazendo muita dor..

"Oh... por que abri minha concha e deixei passar o que não queria? Preciso limpar-me, retirar este sentimento que me machuca"...Pensando assim, machuquei-me ainda mais. Abri em mim enormes arranhões, os quais não quis que cicatrizassem por amor; preferi retirá-los pelo ressentimento, raiva... eu retirei cada grãozinho...não deixei nada. Só feridas abertas... claro, minha concha jamais deveria ficar desguarnecida novamente. Iria abrir pequenas portinholas e ficaria vigiando. Passei a enxergar o mundo por pequenas ilusões...bastava... não me deixaria mais seduzir pelas águas do oceano.

Mas, viver é eterno aprendizado...

Um dia, distraída pela correnteza, não percebi que outro grão de areia havia entrado e se instalado dentro de mim... A primeira reação, como das outras vezes, foi expulsar violentamente quem me feria.. mas, lembrei-me das consequências....Que tal, desta vez, curar-me em vez de aumentar meu sofrimento? Pensando assim, envolvi aquela areia intrusa, com meu carinho, meu desvelo... e à medida que a envolvia, ia me sentindo melhor. Aprendi a cicatrizar os amores perdidos, as desilusões, a dor; e ali, bem no cantinho, pude perceber, que algo maravilhoso acontecia... a minha cicatriz era uma belíssima pérola negra, que eu cultivara. Era minha lição aprendida.

Por que então me esconder para não sofrer? É este sofrimento que me dá a pérola que eu preciso para tornar-me única, bela, especial. A ostra capaz de produzir maravilhas...

Abri-me então para a vida, o amor, a dor e as cicatrizes.

Hoje tenho muitas pérolas: negras, raras, de brilho intenso. Tenho orgulho delas. São o que sou e em mim mora a fortuna.

Continuo aberta. Deixo entrar a água, o carinho, mas também a dor, que transformo sempre em pérolas...

Tenho um pequeno tesouro, e ele não é meu. É para alguém especial... é todo seu, meu amigo/amor.

Venha, entre, sou uma ostra aberta para amar, viver intensamente e ser amada. Pegue cada pérola que encontrar. Quero fazê-lo rico com elas. Quero partilhar consigo o que tenho e sou... Adorne-se com minha história de vida... funda-a com sua história também, e faça destas negras pérolas um colar belo... ostente-o. Foi um tesouro feito ao longo dos anos, com labor.

Se as pérolas se estragarem? Se o colar ficar arrebentado? Não importa. Teremos dançado o baile supremo do amor e da amizade... nos iluminado por seu brilho intenso... só por isso, já terá valido a pena entregar a você todas as minhas pérolas.

Continuo ostra.. pequena... às vezes perdida neste mar profundo dos sentimentos. Mas, hoje, já sei fabricar pérolas e melhor ainda, entregá-las a alguém.

Ana Teresa
Enviado por Ana Teresa em 11/04/2013
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