A MENDIGA
As pessoas apressadas fingiam não ver a figura que ia de um lado para outro com as mãos estendidas na tentativa de ganhar uns trocados.
Aquela figura cheirava mal a metros de distância. Será que alguém por um segundo sequer chegara a questionar a história e sentimentos daquela mulher?
Magérrima. Molambuda. Pele enrugada, descamando e cheia de creca. Cabelos emaranhados, opacos, ensebados e endurecidos pela falta de asseio.
Muitos ao avistá-la atravessavam a rua numa clara tentativa de evitar o contato e o cheiro horripilantes.
No fundo, aquele vulto era a materialização do que se tentava evitar. Representava, entre outras coisas: a vergonha, o medo, a tristeza, o horror, a solidão. Desigualdade social, reveses da vida, escombros, decadência, filhos de uma sociedade enferma.
Outros, alheios aos que caminhavam ao lado. Com tempo apenas para o sonho de prosperar, avançar, escalar. Esses anteviam o horizonte cor de rosa, símbolo de mesa farta, carro do ano – de preferência importado; roupa de marca, joias que ostentem a ascensão social...
Enquanto isso, lá na Ponte de Ferro, a mendiga permanece incomodando os transeuntes.
30/03/2013