Diálogos impagáveis

Assunto: Morte do poeta simbolista brasileiro Cruz e Sousa (Florianópolis, 24/11/1861 -Estação do Sítio, 19/03/1898).

Lembrei de ti...

ACROBATA DA DOR

Gargalha, ri, num riso de tormenta,

como um palhaço, que desengonçado,

nervoso, ri, num riso absurdo, inflado

de uma ironia e de uma dor violenta.

Da gargalhada atroz, sanguinolenta,

agita os guizos, e convulsionado

salta, gavroche, salta clown, varado

pelo estertor dessa agonia lenta ...

Pedem-se bis e um bis não se despreza!

Vamos! retesa os músculos, retesa

nessas macabras piruetas d'aço. . .

E embora caias sobre o chão, fremente,

afogado em teu sangue estuoso e quente,

ri! Coração, tristíssimo palhaço.

Amplexos,

(...)

Bom saber que te lembras de mim.

Tu, que da minha casa não sai, nem nas horas de sono. Pois, se acordo, te tornas real em minha loucura e esquizofrenia...

Sinto somente a falta de teus ósculos. Amplexos não me bastam.

Ou decidiras que eles só seriam aqueles dois ou três passarinhos que libertamos no Passeio?

(...)

Que poeta! Quem me dera ... todos os dias... até o fim...

Eu decidi? Ou tu decidiu? Já sei! Acabei de me lembrar! Decidimos juntos!

Realmente, libertamos poucos passarinhos, pouquíssimos!

Havia tempo que aqueles estavam presos, libertamos alguns poucos, mas, há tantos sedentos que ainda anseiam pela liberdade...

Ah! Não se esqueça que sou de carne, osso, sangue, sentimento e desejo...

Enfim, sou bem real!

(...)

Nai... Nai!

(...)

Assim soo um como sádico. Sonido que faz entrever a essência - um concerto, Stravinsky, sua Ave de fogo,

Mas, talvez esses vapores sanguinos é que matizem esta paixão violenta, tanto, que me arrebentam os limites, todos tão logo folgue um ínfimo pouco de sua vigília a "minha razão".

Entenda-me!

Minhas paixões são como uma boiada: milhares. Estão lá aquietados, lassos. Mas se um chifrudo berra e irrompe contra o cercado, já não há o que ou quem lhos possa controlar. Pois os outros sempre seguem o primeiro - nem se importam aonde vão.

Temo perder-me de vez.

Desconfio que sequer você... suportaria a liberdade do Dionísio latente em mim.

Eu não me suportaria. E, então um pouco razoável, temo o fim que disso me viria.

De qualquer sorte, sou seu:

o cabo, o rabo e o mais que me quiser -

carne, ossos;

nervos, peles e pelos;

a língua, os dedos, os lábios, ...

Bem, eu ando sendo só desejo...

(...)

Calei-me;Tranquei-me a palavra!

Fui golpeada! Desfaleci!