RETRATO DA VIDA
A luz bruxoleante da vela
espalhava sombras fantasmas pelo chão.
O homem, mesmo assim,
mantinha um jornal diante dos olhos
procurando ler.
A mulher costurava, costurava, costurava.
Era um costurar sem fim
para dar conta do trabalho.
Os dois meninos, sentados à mesa,
faziam seus deveres de escola,
enquanto cantarolavam
refrões de músicas à meia voz,
quase que imperceptíveis,
para não atrapalharem o silêncio
quebrado apenas pelo barulho
da máquina de costurar.
Era uma família feliz.
Feliz?
Bem, sem dinheiro,
o homem desempregado.
Mas havia Deus ali dentro.
Uma grande imagem da Virgem
estava a um canto da sala, sobre o móvel
com a vela acesa...
Energia elétrica? Nem sonhar.
Por aquelas bandas ainda não existia.
Lá fora, a noite caía
e com ela a chuva a molhar os campos.
Da cozinha, ainda no ar o cheiro da sopa
que acabaram de comer.
E era só.
Depois iriam para suas camas dormir.
Acordariam no outro dia
e retomariam o curso de suas vidas
cada qual no seu lugar.
O trabalho, a escola, o desemprego,
as brincadeiras dos meninos enfim.
Um retrato da vida!