O TELEFONE

- “Alô! Vera?... oi, quando nos veremos?”

perguntou Izabel ao telefone.

- “... as pessoas nem acreditam

que não nos vemos há muito tempo...”

Izabel e Vera,

amigas,

mesmo emprego, mesma cidade.

- “... pois é, já faz muito tempo...”

O telefone...

O telefone necessidade

aumentando distância

e afastando pessoas.

Sem telefone

Izabel veria Vera mais vezes,

em casa

ou mesmo no emprego,

afinal são seis horas diárias de expediente,

mesmo prédio e mesmo horário.

-“...um abraço...” disse Izabel

como se o abraçar fosse apenas uma idéia

não um ato concreto...

É assim:

quem telefona não vai,

não vai porque telefona...

Há hoje o telefone

afastando cada vez mais as pessoas

e unindo-as por um fio,

frio fio do telefone.

Vezes e vezes,

quem sabe,

Vera quis ver Izabel,

quis ver Leonel,

quis ver Manoel,

quis ver não sei quem mais

mas não foi, telefonou.

Quem sabe o mesmo não se deu com Izabel...

Hoje só se usa telefone:

é tele-água,

é tele-conferência,

tele-criança,

tele-despertador,

tele-horóscopo,

tele-gás,

tele-medicamento,

tele-paz,

tele-piada,

tele-sexo,

tele não sei o que mais...

Durante o dia

mulheres e homens ao telefone:

“...amor, tudo bem? ... em casa conversaremos...”

Em casa, à noite, tudo:

o jornal,

as novelas,

o futebol,

o jogo de cartas,

a cama,

o sexo-rotina,

(tape mudo) onde ninguém fala,

tudo enfim,

mas conversa mesmo nada.

No dia seguinte, ao telefone,

repete-se o mesmo ritual.

O que aconteceu com os humanos?

Será que todo mundo esqueceu o diálogo

franco,

aberto,

frente a frente

e só sabe conversar ao telefone?