CONTOS POÉTICOS: ENTRE PONTEIROS, NOZES E NÓS
Era um tímido sol de entardecer despedindo-se pela janela do quarto, depois de ter acompanhado a desordem da colcha com flores de cor goiaba.
Pelas pernas eles estavam entrelaçados como um nó e se olhavam subjetivamente por debaixo do lençol. Sequer perceberam que estrela dourada já os tinha abandonado.
A nogueira daquela marquesa exalava uma fragrância amadeirada e com esse aroma eles decidiam qual seria a velocidade de seus relógios de pulso.
Quando a roupa de cama se esticava de um lado, do outro somente havia um ato complacente, pois eles continuavam entre risos, ponteiros, nozes e nós.
Incontáveis cascas do fruto se rompiam pelas mãos e pelos pés deles, mas como os moveis eram de matéria emudecida nenhum se atrevia a dizer de quem fora quem. E eles, nutrindo-se do delicioso bocado oferecido por uma cesta de cobre, prolongavam as unidades de tempo ao som da eternidade de um tango.
Pendurado na parede, um relógio de cuco se pôs um pouco entediado. Ele estava obrigado a cumprir com os compromissos e submeter-se ao que se tinha estabelecido como minutos, e para empiorar, tinha que suportar que o casal desprezasse sua existência. Sem ter mais o que fazer com seus ponteiros, fez um sinal para que o sol o esperasse e lhe perguntou:
“Já que você os abraçou por esta tarde, gostaria de saber se ainda terei que esperá-los por mais tempo que meu tempo possa compreender!”
O sol, de sorriso sábio e olhar amistoso, lhe respondeu:
“Apesar de tua casa antiga, desapegue-se de tua contemporaneidade. Enquanto houver nozes que os alimentem e nós que os atem, não creio que eles se lembrem de ti...”