Uma tarde no jardim

Uma tarde no jardim

Admirável aquele

cuja vida é um contínuo

relâmpago

Bashô

Quando os olhos lhe arderam de tanto ler o livro sobre a sabedoria do eneagrama, ele os descansou olhando para o céu imensamente azul. Olhou tão demoradamente que percebeu tons de amarelo, vermelho, rosa e azul e todos os matizes se misturavam com a cores das bougainvilleas que cobriam a cerca do jardim. Então ele viu o quanto seu jardim era grande e belo.

-Quando estou completamente em mim eu percebo que estou em mim profundamente., pensou . Era como se tivesse lavado as lentes dos seus óculos com detergente e enxugado os cuidadosamente com um guardanapo sedoso.

Viu a beleza do céu porque não tinha com o que compará-lo, porque aquele céu era único e sem precedente em sua memória.

O vento balançava suavemente as folhas das árvores, olhou para aquela maritaca tagarela em pleno voo, deu uma mordida na pera e a tarde toda tinha o gosto de fruta fresca.

Em torno dele tudo estava em movimento, o automóvel que passava distante, o pássaro que cantava no alto do Ipê amarelo, até a orquídea que morava no tronco da araucária também balançava seus pequenos galhos.

Ele pensou que mais distante na capital e em muitas outras capitais e cidades pequenas seus amigos todos, estavam em movimento, correndo atrás de suas cotas, carreiras, dos seus ganha-pão. Alguns correndo apenas para preencherem o vazio imenso que o não fazer nada deixa.

Ele ali parado olhando para o céu e para o seu jardim à um só tempo; Aprendeu que nunca estamos mais ocupados do que quando estamos realmente sem fazer nada.

Lembrou de quando estava como que andando em volta de um abismo, antecipando como seria o mergulho, como aquele turista na fila aguardando sua vez, enquanto o instrutor de bungee jumping acerta o equipamento de alguém à sua frente.

Ele se deu conta de que tinha que decidir por si mesmo, não haveria quem pudesse empurra-lo.

Ninguém pode forçar ou mesmo ajudar alguém a mergulhar no abismo de si mesmo e viajar até onde se esconde seu verdadeiro eu.