Flor Azul

Era uma vez, há não muito tempo atrás e a poucas milhas daqui, um lugar belíssimo, com encantadores jardins e infinitos tipos de flores. Era uma vez, também nesse jardim e ainda nesta história, certa flor azul. Não era nem grande nem pequena, nem bela nem feia, nem cheirosa ou mal-cheirosa, não era sequer uma flor excepcionalmente inteligente, a olhos comuns parecia uma flor comum, porém recebia tratamento especial. Um homem muito gentil, um cientista, cuidava dela com todo o amor e carinho que algum ser humano poderia um dia ter por uma flor azul. Ele, contava para a flor, havia a criado. Dizia a ela que era especial, e única, e a flor, sempre que elogiada, empertigava-se em seu pequeno vaso de argila, o que alegrava o coração do cientista. Viveu com ele, criada por ele, sempre tida em alta estima na vida do mesmo, que todas as noites lhe contava histórias antes de dormir e a ouvia contar sobre os sonhos que tinha.

Certo dia, ao observar o jardim de seu lugar à janela, a flor viu como as outras flores eram felizes, banhadas diretamente pelo sol, sentindo o renovador toque das gotas da chuva, tremulando aos eternos rebuscares do vento com a companhia de suas iguais, enfim, as outras flores, percebeu, eram plena e completamente felizes, tinham a alegria que acreditava faltar em sua vida. O tempo passou e a flor permanecia ali, em seu ser ressoando a esperança de um dia ser levada, por seu criador, para viver no mundo além da janela pela qual o via. Vendo que sua querida flor estava triste o cientista a questionou. A flor desmanchou-se em lágrimas, falando ao seu criador de seu imenso desejo de conhecer o mundo real. Entristecido, por dar seu melhor à flor e ver que seu melhor não lhe era suficiente, o homem disse que, se assim desejava, ele poderia deixá-la no mundo lá fora, mas não mais poderia trazê-la para dentro. Sem pestanejar a flor aceitou a proposta, sem sequer pensar na tristeza que abateria o pobre homem.

Fora, no jardim, a flor viveu por algum tempo. Permanecera em seu pequeno vaso de argila, pois era melhor que assim fosse já que ali havia tudo de que precisava para sobreviver. Por um tempo foi feliz, tendo a amizade dos girassóis que muito a prezavam, mas os girassóis eram seres muito singelos, que prezavam a todos igualmente. Os girassóis eram um tanto ingênuos, mas tinham um grande coração. Eles sempre estavam ali para a flor azul, sempre que ela precisasse, mas eles nunca a olhavam. Estavam sempre observando o curso do sol, o que a irritava um bom bocado, por ser tão acostumada a ter toda a atenção e a ser continuamente elogiada.

A flor logo percebeu que, entre as flores do jardim, havia uma espécie de hierarquia e as Rosas estavam no topo dela. Passavam o dia a elogiarem umas às outras, porém deve ser dito que, na verdade, aquilo não passava de inveja. Umas rosas queriam ter os espinhos que as outras tinham, por serem mais firmes ou mais finos. Outras queriam as folhas de certa rosa, por serem de um verde diferente. Mesmo sendo todas as rosas, por natureza, belas. A flor tentou, certo dia, aproximar-se das rosas. Falou com elas, que sequer olharam em sua direção, continuando, sem notar sua presença, seus eternos cortejos. Na certa, pensou a flor, pensam que não sou daqui, pois não estou ligada ao mesmo solo que elas. Com esse pensamento em mente a flor pediu a seus amigos girassóis que a ajudassem a sair de dentro de seu vaso, e os girassóis, como sempre, ajudaram-na.

Fora de seu vaso a flor podia sentir toda a vida do jardim. Ligada à mesma terra que todas as plantas dali, entendia, finalmente, o que era a natureza. Depois de um tempo a flor começou a entrar em desespero: Não podia encontrar os nutrientes que lhe eram familiares. Dentro de alguns minutos começou a murchar. Não conseguia emitir um som sequer. Não podia pedir ajuda aos amigos girassóis que estavam sempre fitando o sol, e nem sequer às rosas que, tão imersas em seu jogo de elogios, não viam que o que acontecia: A morte de uma amada flor azul. Algum tempo passou e as rosas param seus floreios. Uma delas inclinou-se para observar de perto o que acontecia. Depois de um tempo ergueu-se e disse, com certo desprezo transparecendo em sua bela voz:

— Pois, imaginem só, caras companheiras. Nós, rosas tão belas, perdendo nosso precioso tempo com a morte de uma reles flor do campo.

Em seu último momento, já sem cor, uma alegria tremeluziu dentro da flor. Então, afinal, havia provado da alegria, mas não soubera distinguir o seu sabor. A sua alegria estivera no amor daquele cientista que, mesmo sabendo que era apenas uma ordinária flor do campo, a criou com todo amor.